CURSO DE MESTRADO DE TEOLOGIA SISTEMÁTICA
DISCIPLINA - ANTROPOLOGIA
A CRIAÇÃO DO UNIVERSO
E DA HUMANIDADE
A Bíblia
foi escrita durante um período aproximado de 1.500 anos,
por cerca de quarenta escritores. Mas a atividade salvífica de Deus - e a
resposta humana a ela - parece ser um tema que percorre
a totalidade das Escrituras. Devemos, portanto, manter em vista esse tema ao
abordarmos os ensinos da Bíblia arespeito da criação do Universo e da natureza
dos seres humanos.
A Criação do Universo
As
Escrituras claramente retratam Deus como um Ser com propósitos. Provérbios 19.21
observa: "Muitos propósitos há no coração do homem, mas o conselho do
Senhor permanecerá". Deus declara: "Anuncio o fim desde o princípio
e, desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu
conselho será firme, e farei toda a minha vontade" (Is 46.10; cf. Ef 3.10-11; Ap 10.7). 1
O estudo
da criação deve, portanto, procurar analisar o propósito de Deus na criação (ou
seja, o Universo é o que é porque Deus é quem Ele é). 2
E, qual
o propósito de Deus na criação do Universo? Paulo explica: "[Deus...]
descobrindo-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito, que
propusera em si mesmo, de tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na
dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que
estão na terra" (Ef 1.9-10).
Acrescente-se que o propósito de Deus para a humanidade
é inseparável de seus propósitos globais para a criação (nós, os seres humanos,
somos o que somos porque Deus é quem Ele é). O apóstolo Paulo, falando da nossa
futura existência imortal com Deus, declara: "Ora, quem para isso mesmo
nos preparou foi Deus, o qual nos deu também o penhor do Espírito" (2 Co
5.5).
Há, portanto, uma unidade indissolúvel entre os
ensinos da Bíblia a respeito de Deus, da criação do Universo e da criação e
natureza da humanidade. A unidade provém do propósito de Deus na criação. E o
propósito de Deus para a sua criação, mais especificamente para a humanidade, é
captado na bem conhecida confissão: "O fim principal do homem é glorificar a Deus e desfrutá-lo para sempre". 3
Deus como o Criador
Os escritores sagrados não hesitam
em atribuir a Deus a criação do Universo. Consideram apropriado, portanto, tributar-lhe toda a reverência, o louvor e a glória devidos ao
Criador.
Os escritores do Antigo Testamento normalmente creditam
a Deus a criação do universo físico, usando o verbo bara' - "ele criou". O primeiro versículo das
Escrituras declara: "No princípio, criou Deus os céus e a terra" (Gn
1.1). Esta sucinta declaração antevê o restante de Gênesis l.4 Ao introduzir
o tema da criação, Gênesis 1.1 responde a três perguntas: (1) Quando ocorreu a
criação? (2) Quem é o sujeito da criação? (3) Qual é o objeto da criação?
Gênesis 1.1 destaca o fato de um começo verdadeiro,
ideia evitada pela maioria das religiões e filosofias, antigas e modernas. u[B]ara'... parece
indicar que os fenômenos físicos vieram a existir naquela ocasião, e que não
tinham existência prévia, na forma em que foram criados pelo fiat divino".5 Em outras palavras, até
esse momento nada absolutamente existia, nem mesmo um átomo de hidrogênio.
Do
nada (latim ex nihilo) Deus criou os céus e a Terra.
De conformidade com Gênesis 1.1, o sujeito da criação
é “Deus”. O verbo bara', em sua forma mais comum, é usado no hebraico somente
no tocante a atividade divina, jamais se referindo a atividade
"criadora" humana.6 A criação revela o poder de Deus (Is 40.26), sua majestade (Am 4.13), seu trabalho
ordenado (Is 45.18) e sua soberania (SI 89.11-13). Como Criador,
Deus deve ser reconhecido onipotente e soberano. Quem rejeita a doutrina
bíblica da criação desdenha o reverente temor a Deus devido por força desses
atributos.
Gênesis 1.1 declara que Deus criou "os céus e a
terra". No Antigo Testamento, "os céus e a terra" abrangem a inteireza
do "Universo ordeiro e harmonioso".7 Nada existe que não
tenha sido criado por Deus.
Os escritores do Antigo Testamento também empregam o
termo yatsar ("formar",
"modelar") para descrever atos criadores de Deus. Por exemplo,
descreve apropriadamente o "oleiro", alguém que forma - ou plasma -
um objeto segundo a sua vontade (Is
29.16). Quando, porém, aplicado à ação divina,8 parece empregado em
paralelismo sinônimo com bara', indicando a mesma espécie de atos divinos singulares.
Embora esteja claro que Deus "formou" o primeiro homem com o pó da
terra (significa que Ele modelou o homem a partir de algo que já existia),
estaríamos levando o termo além da intenção do escritor veterotestamentário se
disséssemos que yatsar abre
a porta a processos evolucionários.
Finalmente, os escritores do Antigo Testamento empregam
um terceiro termo primário ao descrever a atividade divina na criação: 'asah ("fazer").
Assim como yatsar, 'asah geralmente apresenta um escopo muito mais amplo que bara'. Porém, quando colocado numa declaração de ato criador
em paralelo com bara' (Gn
1.31; 2.2,3; 3.1; 5.1), pouca diferença parece haver entre o significado dos
dois termos. E, apesar do significado por vezes mais amplo que bara', 'asah não possui flexibilidade suficiente para sustentar o
conceito de evolução.
Os
escritores do Novo Testamento não se mostram mais reservados que seus pares do
Antigo Testamento em atribuir a Deus a criação do Universo. Não é possível
desconsiderar os ensinos do Antigo Testamento sobre a criação (alegando uma
suposta condição cientificamente primitiva) sem ao mesmo tempo atacar
violentamente os ensinos do Novo. A verdade é que o Novo
Testamento cita como fonte de autoridade os 11
primeiros capítulos de Gênesis nada menos que sessenta
vezes!9 Os tópicos incluem o casamento, a linhagem de Jesus, a
depravação humana, os papéis funcionais no lar, o sábado, a nossa imortalidade,
a futura nova criação do Universo e a remoção da maldição no estado eterno.
Repudiando-se a autoridade e a fidedignidade dos 11
primeiros capítulos de Gênesis, que se fará a tais
doutrinas no Novo Testamento?
Fica
evidente que os escritores neotestamentários consideravam o Antigo Testamento
um relato fidedigno dos fatos, registrando-os conforme realmente
ocorreram. O termo primário ktizõ, do Novo
Testamento, significa "criar", "produzir", e ocorre 38 vezes (incluindo-se os seus
derivados). Colossenses 1.16 afirma que por Cristo
foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, visíveis e invisíveis. Em
Apocalipse 4.11, os 24 anciãos
lançam, num gesto de adoração, suas coroas diante do Trono de Deus, atribuindo-lhe a
criação de todas as coisas. Em Romanos 1.25, Paulo lastima que os
idólatras "honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é
bendito eternamente". E, tanto o Novo quanto o Antigo Testamento apontam
o poder de Deus como Criador para nosso consolo e fortaleza nas horas de sofrimento (1 Pe 4.19). O mesmo
Deus, mediante a sua providência, continua zelando por sua criação.
Finalmente,
a Bíblia ensina que Deus sustém - ou mantém - o
Universo. Os levitas, ao tributar louvores a Deus, reconhecem que Ele dá vida a
todas as coisas (Ne 9.6). Ao falar das hostes
estelares, Isaías
40.26 declara: "Por causa da grandeza das suas forças
e pela fortaleza do seu poder, nenhuma faltará". O salmista adora a Deus
porque Ele "conserva os homens e os animais" (SI 36.6). Salmos 65.9-13 retrata
Deus a governar o clima da Terra e a produção de cereais.
No Novo
Testamento, Paulo declara: "Nele vivemos, e nos movemos, e existimos"
(At 17.28). Em
Colossenses
1.17, o apóstolo afirma a respeito de Cristo: "Ele é
antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele". Hebreus 1.3 revela
que o Filho está "sustentando todas as coisas pela palavra do seu
poder". Numerosos outros textos da Bíblia indicam superintendência e
preservação
diretas, pelas quais Deus mantém a sua criação. 10
O Deus
trino e uno operou de modo cooperativo na criação. Muitos textos bíblicos
atribuem a criação a Deus, simplesmente.11 Algumas passagens, entretanto,
especificam Pessoas dentro da Deidade. A criação é atribuída ao Filho em João 1.3,
Colossenses
1.16-17 e Hebreus 1.10. Além disso, Gênesis 1.2, Jó 26.13 e 33.4, Salmos 104-30 e
Isaías 40.12,13 incluem
a participação do Espírito Santo.
Seria
natural perguntarmos: Teriam os membros individuais da Deidade desempenhado
papéis específicos na criação? Paulo declara: "Há um só Deus, o Pai, de
quem é tudo e para quem nós vivemos; e um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual
são todas as coisas, e nós por ele" (1 Co 8.6). Millard
J. Erickson, depois de repassar os textos bíblicos a respeito da criação,
conclui: "Embora a criação seja da parte do Pai, é através do Filho e do
Espírito Santo".12 Sejamos cautelosos na aceitação de
declarações mais específicas do que esta.
As
Escrituras deixam claro que Deus criou tudo o que existe. Conforme mencionado
resumidamente acima, a Bíblia emprega a frase "os céus e a terra"
para a totalidade da criação, o Universo inteiro. E, realmente,
"céus" e "terra" vez por outra são colocados em declarações
paralelas que abrangem toda a criação. Finalmente, às vezes a palavra
"céus" é empregada isoladamente, em referência ao Universo inteiro. 13
Os
escritores do Novo Testamento empregam o termo kosmos ("mundo")
como
sinônimo da expressão veterotestamentária "céus e
terra", para indicar Universo inteiro. Paulo parece equiparar kosmos a
"céus e terra", em Atos 17.24. Diversas outras passagens
do Novo Testamento fazem referência à criação do "mundo", e aí
incluem o Universo.14
Os mesmos escritores empregam
também o termo ta panta, ("todas
as coisas"), para descrever o escopo da atividade de Deus
na criação (nem sempre com o artigo definido). João 1.3 declara
enfaticamente que "todas as coisas" foram feitas através do Verbo
vivo. Paulo menciona Jesus Cristo, através de quem vieram a existir "todas
as coisas" (1 Co 8.6; ver também Cl
1.16).
Hebreus 2.10 fala a respeito de
Deus, para quem e através de quem existem "todas as coisas". Depois,
no livro de Apocalipse, os 24 anciãos adoram a Deus porque Ele criou
"todas as coisas" (4.11; ver também Rm 11.36).
Finalmente, os escritores do Novo Testamento apoiam,
com proposições declarativas,
o conceito da criação ex nihilo, "do nada". Em Romanos 4.17 Paulo cita o
Deus que
"vivifica os mortos e chama as coisas
que não são como se já fossem". E Hebreus
11.3 declara: "Pela fé, entendemos que os mundos, pela palavra de Deus,
foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é
aparente".
Resumindo, a Bíblia afirma que Deus criou o Universo
inteiro. Tudo quanto existe e "não é Deus" deve ao Criador a sua
existência. Por essa razão, a Igreja histórica tem sustentado a doutrina da
criação ex nihilo.
O Propósito da Atividade de Deus na Criação
A criação foi um ato da livre vontade de Deus. Ele
tinha a liberdade de criar ou não criar.15 A criação foi um gesto
gracioso de Deus, pelo qual revelou sua bondade. Gênesis 1 indica que todos os
atos criadores de Deus conduziam a Adão e Eva. O mesmo capítulo demonstra haver correspondência
entre os dias primeiro e quarto, segundo e quinto e terceiro e sexto. O
primeiro e o segundo dia descrevem um só ato criador cada, enquanto o terceiro
dia expõe dois atos criadores distintos entre si. O quarto e quinto dia
descrevem também um único ato criador cada, ao passo que o sexto dia descreve
dois atos criadores distintos entre si. Pode-se perceber a progressão, cujo
clímax é a criação da humanidade. Tudo demonstra que Deus criou de conformidade
com um plano, o qual cumpriu integralmente. Assim, somos encorajados a crer
que Ele também levará a cabo o plano da nossa redenção, na vinda de Jesus
Cristo. Havia um relacionamento entre a graça e a natureza, nas criaturas e na
ordem providencial de Deus.
Em outras palavras, Deus tinha um plano eterno e
salvífico para as suas criaturas, e a criação progride em direção a esse
propósito
ulterior. Antes da criação do
Universo, o propósito de Deus era a comunhão entre Ele e as pessoas, um relacionamento
de aliança (2 Co 5.5; Ef 1.4). Thomas
Oden observa: "A verdadeira história da criação diz respeito ao relacionamento
entre as criaturas e o Criador, e não às criaturas por si só, como se a criação
devesse ser considerada por si mesma autônoma, independente e inderivada”. 16
Deus havia preparado um reino para aqueles que a Ele
correspondessem, desde a (ou "antes da") criação do mundo (Mt 25.34).
O propósito eterno de Deus para a criação foi cumprido através da obra
mediadora de Jesus Cristo (Ef 3.10,11), também planejada antes da criação (Ap
13.8). Esse propósito divino e eterno será consumado quando os tempos se
tiverem cumprido (Ef 1.10). Então, tudo estará debaixo de uma só cabeça, Jesus
Cristo. Esta frase nos revela o verdadeiro propósito da criação: "Para que
Deus fosse conhecido". 17
Ao refletir sobre o momento em que o propósito de
Deus para a criação será cumprido, Paulo escreve: "Para mim tenho por
certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória
que em nós há de ser revelada" (Rm 8.18). Paulo, então, revela que toda a
criação está gemendo, em ardente expectativa por esse momento (8.19-22). Assim
também os crentes, apesar das bênçãos que têm recebido. Eles igualmente gemem,
esperando a redenção do corpo (8.23-25). Nesse ínterim, porém, "sabemos
que todas as coisas18 contribuem para o bem daqueles que amam a
Deus, daqueles que são chamados por seu decreto" (Rm 8.28). O fato de
possuírem os seres humanos a capacidade de amar a Deus pressupõe que a
humanidade foi dotada com o livre-arbítrio na criação.
Posto que a totalidade da criação aponta para o
propósito salvífico de Deus, é de se esperar que haja neste propósito provisão
suficiente para toda a humanidade, inclusive uma chamada universal à salvação.
Os propósitos salvíficos de Deus também resultaram na criação de uma criatura
com livre-arbítrio. 19
Como corolário natural a "muito boa"20
obra de Deus, a criação irresistivelmente
o
glorifica (SI 8.1; 19.1).21
As Escrituras afirmam também que, mediante a criação e o estabelecimento da
nação de Israel, Deus receberia glória (Is
43.7; 60.21; 61.3). E o Novo Testamento, por extensão, revela ainda que todos
os que aceitarem o plano de Deus serão "para louvor da sua glória"
(Ef 1.12,14). Colossenses 1.16, de forma semelhante, assevera: "Tudo foi
criado por ele e para ele". E, em virtude do seu maravilhoso plano na
criação, os 24 anciãos adoram a Deus e dão a glória devida ao seu nome (Ap
4.11).
Finalmente, o fato de o propósito de Deus incluir um
tempo de consumação nos obriga a considerar que esta criação é transitória. 2
Pedro 3.10-13 descreve uma ocasião em que os céus e a terra serão dissolvidos,
enquanto
Isaías 65.17 e Apocalipse 21.1
falam de novos céus e nova terra como cumprimento do plano de Deus. 22
A Cosmogonia Bíblica e a Ciência Moderna
Alguns críticos bíblicos sustentam que não há
reconciliação possível entre a cosmogonia (conceito da origem e desenvolvimento
do Universo) bíblica e o que é aceito pela comunidade científica hoje. Alguns
estudiosos da Bíblia, entendendo de modo literal numerosas figuras de linguagem
no Antigo Testamento, argumentam que os hebreus
acreditavam que o Universo consistia de uma terra plana sustentada por
"colunas" colossais sobre um abismo de água. O "firmamento" (céu)23 em cima era uma arcada sólida que
mantinha afastadas as águas (que ocasionalmente caíam pelas
"janelas" da arcada) que estavam acima da terra. 24
H. J. Austel, rechaçando essa interpretação excessivamente
literalista dos textos do Antigo Testamento, explica: "O emprego de
semelhante linguagem figurada não obriga à adoção de uma cosmologia pagã, assim como o uso moderno da expressão 'pôr-do-sol'
subentende ignorância astronômica. A linguagem figurada é frequentemente
fenomeno- lógica, e é conveniente, além de causar vívido impacto".25
Mesmo levando-se em conta a linguagem figurada, persistem
algumas dificuldades. Onde se encaixam os fósseis dos dinossauros na cosmologia bíblica? Existem evidências de um dilúvio global,
poucos milhares de anos antes de Cristo? Teria realmente a Terra 4,5 bilhões de
anos de idade? A maioria dos evangélicos, convicta de que o mundo de Deus há de
concordar com a sua Palavra, busca respostas a estas intrigantes perguntas - e
a outras também.
De modo geral, os cristãos evangélicos seguem um dos
quatro modelos seguintes, que buscam harmonizar a revelação especial de Deus
(a Bíblia) com a revelação geral (o que observamos no Universo). São eles: (1)
evolução teística; (2) teoria da lacuna, ou conceito da ruína e reconstrução;
(3) criacionismo fiat, conhecido
também por teoria da Terra jovem; e (4) criacionismo progressivo, denominado
teoria do dia-época.
Examinaremos resumidamente os modelos acima, exceto a
evolução teística. O estudo desta não nos servirá aqui a nenhum propósito útil
porque os seus proponentes aceitam basicamente tudo quanto propõe a evolução
secular, entendendo que Deus apenas supervisionava o processo.26 Os
proponentes da evolução teística costumam negar que yatsar e 'asah sejam
usados em
sinonímia paralela nos relatos da
criação, afirmando que, pelo contrário, incluem o conceito da evolução no
decurso de longas épocas de tempo.
Neste estudo, são necessárias ainda certas generalizações.
Mesmo que determinado escritor, dentro de certo modelo, não represente com
exatidão o consenso deste em todos os seus pormenores, podemos, para atender aos nossos propósitos,
aproveitar aquele como representante da posição global. Na realidade, nenhum
autor individual concorda inteiramente com as conclusões de outros adeptos do
mesmo conceito geral. E, finalmente, muitos autores não especificam a identidade
do seu modelo.
Deixando de lado, por enquanto, a evolução teística,
os outros três modelos concordam que a macroevolução - a transmutação de determinado tipo de organismo em
um outro mais complexo (a evolução entre as espécies) - nunca aconteceu (no
sentido de um réptil transformar-se em ave, ou um mamífero terrestre em
mamífero aquático). Mesmo assim, concordam que a microevolução - pequenas mudanças dentro de organismos (a
evolução dentro da espécie) - tem acontecido (como as mariposas que mudam de
cor, as mudanças do comprimento do bico e das cores da plumagem de certas aves ou a variedade que observamos nos
seres humanos, embora estes descendam todos de Adão e Eva).
Concordam também que Deus deve ser adorado como Criador e que Ele, de modo
sobrenatural e sem a inteferência de qualquer causa ou agente (por atos
criadores sobrenaturais e distintos entre si), criou
os antepassados genéticos dos principais grupos de organismos de plantas e
animais hoje conhecidos. E, finalmente, concordam que os seres humanos derivam
o seu valor do fato de haverem sido criados diretamente à
imagem de Deus. No estudo que se segue, as áreas de concordância citadas neste
parágrafo devem ser mantidas em posição de destaque.
A teoria da lacuna. Os
proponentes da teoria da lacuna argumentam que houve, num passado muito remoto,
uma "criação primitiva", referida em Gênesis 1.1. Isaías 45.18 declara:
"Assim diz o Senhor que tem criado os céus, o Deus que formou a terra e a
fez; ele a estabeleceu, não a criou vazia [no hebraico, tohu], mas a
formou para que fosse habitada". Este versículo, segundo a teoria da
lacuna, comprova que Gênesis 1.2 não pode estar descrevendo
a criação original de Deus como vazia e sem forma (tohu), mas que
era uma ordem perfeita, que continha uniformidade, complexidade e vida. 27
Esta
teoria propõe que Satanás, que era arcanjo antes da sua queda, governava essa
Terra pré-adâmica, um reino originalmente perfeito.28 Então ele,
juntamente com as cidades e nações dos povos pré-adâmicos, rebelou-se, e a
Terra (o seu domínio) foi amaldiçoada e destruída por uma inundação (cujos
resultados são referidos em Gênesis 1.2: "a face do
abismo"). Esse mesmo versículo indica que "a terra era sem forma e
vazia". Arthur Custance argumenta que a frase "sem forma e vazia"
alude a uma expansão arruinada e devastada como resultado de um julgamento e
que deve, portanto, ser interpretada como "uma ruína e uma desolação".
29
Isaías 24.1 e
Jeremias
4.23-26 são citados pelos adeptos da teoria da lacuna como
evidências desse juízo cataclísmico (embora esses textos se refiram ao juízo
futuro). E a
declaração de Jesus em Mateus 13.35 - "desde a criação do
mundo" -
significaria "desde a derrocada do mundo".30 Afirmam ainda
que o dilúvio citado em 2 Pedro 3.6-7 não é o
de Noé - o contexto é "o
princípio da criação" - mas um primeiro dilúvio, que destruiu o mundo pré-adâmico.31
Alguns proponentes apontam o acento disjuntivo rebhia, introduzido
pelos rabinos medievais entre Gênesis 1.1 e 1.2 para indicar uma subdivisão.32
Além disso, a conjunção hebraica waw pode indicar "e", "mas" ou
"ora". Então, optam por traduzir assim o versículo 2: "A terra
tornou-se sem forma e vazia". Mas reconhecem que a Bíblia não declara o
tempo que a Terra permaneceu nesse estado caótico (lacuna) - entre Gênesis 1.1
e 1.2.33 H. Thiessen diz: "O primeiro ato criador ocorreu no
passado sem data, e entre ela e a obra dos seis dias há espaço bastante para
todas as eras geológicas". 34
Os adeptos da teoria da lacuna declaram, no entanto,
que Deus finalmente reiniciou o processo criador na neocriação - ou
reconstrução - descrita em Gênesis 1.3-31.35 Alegam ainda que a
expressão "Deus criou" leva em conta uma nova criação, uma nova moldagem do Universo, que não precisa estar restrita a um
primeiro evento. Alguns desses teóricos entendem que os "dias" da
criação duraram 24 horas. Outros, que os "dias" de Gênesis 1 são
períodos indefinidamente longos.
Em Gênesis 1.28 - "Frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra" - a
palavra "enchei", para eles, pode significar "encher de
novo" uma Terra que já fora cheia em tempos anteriores.36
Alguns defendem que Deus emprega a mesma palavra quando manda Noé "encher" a Terra, em Gênesis 9.1.
Além disso, creem que a aliança em Gênesis 9.13-15
(onde Deus promete: "As águas não se tornarão mais em dilúvio, para
destruir toda carne") pode sugerir que Deus tenha empregado essa forma de
julgamento em mais de uma ocasião, anteriormente.
Fósseis humanos antigos, juntamente com fósseis de
dinossauros, são considerados evidências desse mundo pré-adâmico. A nota na
Bíblia de
Scofield explica: "E só
relegar os fósseis à criação primitiva, e não sobra nenhum conflito entre a
ciência e a cosmogonia de Gênesis". G. H. Pember declara:
Posto, portanto, que os remanescentes dos fósseis são
de criaturas anteriores a Adão, mas mostram sinais evidentes da doença, da
morte e da mútua destruição, devem ter pertencido a outro mundo e possuído uma
história própria, manchada pelo pecado, história esta que culminou na ruína
deles mesmos e de sua habitação. 37
A teoria da lacuna, no entanto, apresenta várias
fraquezas. A língua hebraica não permite uma lacuna de milhões ou bilhões de
anos entre Gênesis 1.1 e 1.2. O hebraico tem uma forma especial, que indica
sequência e introduz aquela forma a partir de 1.3. Nada indica uma falta de
sequência entre 1.1 el.2. Por isso, 1.2 pode muito bem ser assim traduzido:
"Ora [no princípio] a terra era sem forma e vazia de habitantes".
Os atuais eruditos em Antigo Testamento geralmente
reconhecem Gênesis 1.1 como uma introdução resumida à criação, cuja história o
restante do capítulo relata com mais pormenores.38 O versículo não descreve um mundo pré-adâmico. Pelo contrário, apresenta ao leitor o mundo que Deus
criou, ainda sem forma e vazio. Ou seja: Deus não criou a Terra com sua forma
atual de continentes e montanhas, nem com pessoas já habitando nela. Nos três
primeiros dias, Ele deu forma à criação; e nos três dias seguintes a encheu. O
restante da Bíblia refere-se a esses dias como criação, e não como nova criação.
Acrescente-se que os verbos bara', yatsar e asaii são usados em paralelismo sinônimo em vários
trechos de Gênesis e de outros livros da Bíblia.39 Devemos ser
cautelosos em atribuir significado mais amplo a qualquer um desses verbos
apenas por se conformarem melhor a determinada teoria. O verbo
"enchei" (1.28 - ARC) não significa "encher de novo" alguma
coisa que já foi cheia anteriormente. Significa simplesmente
"encher".40 E o verbo "era" no versículo 2
("a terra era sem forma e vazia") não deve ser traduzido por
"tornou-se" ou "tornara-se" só para conformar-se à teoria
da lacuna.41
Finalmente, a teoria da lacuna anula a si própria. Ao
relegar as camadas fósseis ao mundo pré-adâmico, com o propósito de harmonizar Gênesis 1 com os dados
científicos, não deixa evidência alguma de uma catástrofe global nos dias de Noé. Custance, o mais técnico dos proponentes da teoria
da lacuna na segunda metade do século XX, notou essa dificuldade e optou por um
dilúvio local, na Mesopotâmia e
suas
circunvizinhanças.42
Entretanto, Gênesis 6.7,13,17, 7,19-23, 8.9,21 e 9.15,16 nitidamente destacam
que a extensão do dilúvio era universal.
O críacionismo fiat. Outro
modelo adotado pelos cristãos evangélicos hoje é o criacionismo fiat ou teoria
da Terra jovem. Seus proponentes argumentam que as Escrituras devem ser
interpretadas literalmente sempre que possível, para se chegar à verdade
original pretendida pelo autor.43 Por isso, os criacionistas fiat
sustentam que um cálculo geral pode ser feito com base na data da construção do
Templo registrada em 1 Reis 6.1 (966-67 a.O), voltando até o surgimento do homem no sexto dia
da criação. Embora os escritores bíblicos talvez não tivessem a intenção de
promover um cálculo matemático dessa natureza, os resultados não deixarão de
ser exatos, porque a Palavra de Deus é inerrante. Esses versículos, portanto,
parecem indicar não ter a Terra mais que dez mil anos de idade. 44
Os defensores da teoria da Terra jovem argumentam que
Deus criou o Universo pelo seu divino "Fiat", um decreto sobrenatural
e imediato - Ele não precisaria de milhões ou bilhões de anos para levar a
efeito o seu propósito. De acordo com esse ponto de vista, os dias da criação
em Gênesis devem ser considerados literais, pois era assim que os hebreus entendiam o termo. Êxodo 20.11, explicando a razão da
guarda do sábado, declara: "Porque em seis dias fez o Senhor os céus e a
terra, o mar e tudo que neles há, e ao sétimo dia descansou" (veja também
Mc 2.27). E inconcebível, dizem os criacionistas fiat, que Deus tenha feito tal
revelação a Moisés se os atos divinos da criação realmente abrangessem milhões
de anos.45
Duvidam eles das vastas eras calculadas através das
várias formas de datação radiométrica
e levantam objeções, por diversos motivos. Primeiro: jamais poderão ser
comprovadas as seguintes pressuposições da datação radiométricas: (1) que Deus não criou a Terra já com a presença de
locais radioativos e com elementos derivados (que também são o produto da
decadência radioativa); (2) que o ritmo da decadência radioativa tem sido
constante durante 4,5 bilhões de anos; e (3) que não houve lixiviação dos elementos precursores ou dos derivados, no
decurso de
4,5 bilhões de anos.
Segundo: trabalhos recentes na área da física nuclear parecem lançar dúvidas sobre a datação com urânio-23 8. E terceiro: a datação radiométrica não é fidedigna porque, dependendo do método empregado, pode-se "comprovar" que a Terra tem uma centena ou até milhões de anos de idade. Logo, os vários métodos são grosseiramente incongruentes uns com os outros.46
Segundo: trabalhos recentes na área da física nuclear parecem lançar dúvidas sobre a datação com urânio-23 8. E terceiro: a datação radiométrica não é fidedigna porque, dependendo do método empregado, pode-se "comprovar" que a Terra tem uma centena ou até milhões de anos de idade. Logo, os vários métodos são grosseiramente incongruentes uns com os outros.46
Os
adeptos do criacionismo fiat acreditam ainda que Deus criou a biosfera inteira
num estado maduro, em pleno funcionamento (com seres humanos e animais adultos,
árvores frutíferas maduras etc), bem como o universo físico
(a atmosfera, o solo rico em nutrientes, contendo matérias orgânicas mortas, a
luz das estrelas já alcançando a Terra etc.). Henry Morris chama a isto
"estado de perfeição funcional".47 Por isso, embora os
teóricos do criacionismo fiat concordem que as mutações (quase sempre nocivas)
e as variações horizontais (variedades de cães, por exemplo) aconteçam, negam
que tenha ocorrido a macroevolução.
Finalmente,
sustentam que quase todas - ou talvez todas - as
camadas fósseis foram depositadas durante o dilúvio de Noé ou imediatamente
após, enquanto as águas retrocediam.48 O dilúvio de Noé foi uma
catástrofe global, precipitada pelo afloramento das águas subterrâneas,
juntamente com o colapso de um manto de vapor de água que em certa época cobria
o globo terrestre. Por isso, as camadas fósseis realmente servem a um
propósito teológico: (1) são testemunhas
silenciosas de que Deus não permitirá que o pecado sem arrependimento continue
indefinidamente, sem ser refreado; (2) testificam que Deus já
destruiu o mundo inteiro num ato de juízo no passado, e que Ele certamente tem
capacidade para fazer o mesmo no futuro.49
A
disposição das camadas fósseis depositadas pelo dilúvio coloca os dinossauros
e os seres humanos modernos vivendo no mesmo período. E possível, no entanto,
que os seres humanos daquela época não tivessem consciência da existência dos
dinossauros (assim como a maioria das pessoas hoje nunca viu um urso ou uma
onça na floresta). Os dinossauros eram herbívoros antes da queda do homem,
assim como todos os outros animais da Terra (Gn 1.29,30; cf. 9.1-3). No Reino futuro e ideal de Deus, os
animais não devorarão uns aos outros (Is
11.6-9; 65.25) e possivelmente voltarão ao seu estado de antes da Queda. Por
isso, os proponentes do criacionismo fiat
sustentam que não havia morte na "muito boa" criação de Deus, antes
da Queda (Gn 3; cf. Rm 5.12-21; 1 Co 15.21-22).50 Os defensores da
Terra jovem lembram que os outros modelos, que defendem uma Terra antiga,
jamais explicaram a carnificina anterior à Queda.
A exemplo dos demais conceitos, o criacionismo fiat
apresenta o seu quinhão de problemas. Alguns de seus proponentes, desejosos de reforçar seus argumentos com evidências, tendem
a aceitar sem críticas as novas descobertas. Isto acontecia especialmente há
alguns anos. Por exemplo, em certa ocasião fizeram publicidade das supostas
pegadas humanas fossilizadas no leito do rio Paluxy, no Texas. Pesquisas
posteriores, feitas por criacionistas, lançaram dúvidas sobre a identidade
dessas pegadas, e as matérias publicadas a respeito foram subsequentemente
retiradas.51 Exemplos semelhantes têm incluído a aceitação, por
parte de alguns criacionistas da Terra jovem, de um sol que encolhe e de uma
decadência recente da velocidade da luz - por um fator de dez milhões.52
A equidade exige a explicação de que boa parte da crítica e da rejeição dessas
supostas evidências em favor da Terra jovem provém de dentro do próprio
criacionismo fiat.
Outra fraqueza do criacionismo fiat manifesta-se na
tendência à interpretação demasiadamente literalista das Escrituras. Não
reconhece que palavras em hebraico possam ter mais de um significado, como
acontece em português. Mesmo assim, alguns têm usado tais métodos para buscar
apoio às doutrinas desse modelo.53 Naturalmente revela fraqueza
também a marcante discordância com todas as formas da datação radiométrica, bem
como a rejeição aos dados não-radiométricos que parecem indicar uma Terra mais
velha.54
O criacionismo progressivo. O último modelo proposto pelos evangélicos é o
criacionismo progressivo ou teoria do dia-época. Os proponentes desse modelo
argumentam que os dias da criação, em Gênesis 1, conotam períodos parcialmente coincidentes de tempo
indeterminado.55 Costumam indicar textos no Antigo Testamento em que
"dia" significa algo mais amplo que um dia literal de 24 horas.
Apontam os eventos de Gênesis 2.7-23, que incluíam dar nomes a todos os
animais e aves, acontecidos na parte final do sexto "dia". Acreditam
que Deus criou vários protótipos de plantas e animais, em etapas diferentes e parcialmente
coincidentes, a partir dos quais os processos de microevolução produziram a variedade de flora e fauna que
observamos hoje.
Os defensores do criacionimo progressivo rejeitam a macroevolução e observam que os cientistas estão questionando
cada vez mais "a legitimidade de extrapolar as observações microevolucionárias para a macroevolução". Reconhecem também que
as
genealogias da Bíblia não visavam a
construção de uma cronologia exata.56
Muitos
entendem que Gênesis 1 foi escrito do ponto de vista de um observador
hipotético da Terra. O versículo 1 simplesmente enfatiza que houve um começo
real e que Deus é o Criador de tudo. O versículo 2 descreve a Terra sem forma
(sem continentes nem montanhas) e sem habitantes. Os versículos 3 e 4 falam da
criação da luz, sem registrar sua proveniência. O versículo 5 indica que a Terra girava no seu eixo.
Os versículos 6-8 descrevem a formação da atmosfera, com um manto de nuvens
acima do oceano primevo. Os versículos 9 e 10 descrevem a formação de várias
bacias oceânicas e a primeira massa terrestre, ou continente. Os versículos
11-13, com economia de expressões, tratam dos atos distintivos iniciais da
criação da vida no planeta. Os versículos 14-19 oferecem um relato da criação
do Sol, da Lua e das estrelas, que pela primeira vez devem ter-se tornado
visíveis na Terra, devido a um rompimento pelo menos parcial da cobertura de
nuvens. O restante de Gênesis 1 revela os últimos atos de uma criação
progressiva, possivelmente concretizados com o decorrer do tempo.57
Muitos criacionistas progressivos acreditam que ainda
estamos vivendo o sexto dia da criação58 e que o dia do repouso
divino ocorrerá no estado eterno. Outros acreditam que estamos no sétimo dia da
criação, porque a palavra "descansou" significa "cessou", e
nenhum fim é indicado para o sétimo dia em Gênesis 2.3. Nada na Bíblia indica
que Deus esteja agora criando novos universos.
Pelo fato de serem os cristãos os mordomos da criação
divina (Gn 1.28) e porque "os céus manifestam a glória de Deus" (SI
19.1), esta teoria defende que a busca dos conhecimentos científicos deve
"orientar-se para Deus" ao invés de "orientar-se para os
objetos" ou "para os conhecimentos". Rejeita a cosmovisão
naturalista - mecanicista,
humanista - que domina a ciência contemporânea. Embora continuem rejeitando as
filosofias e especulações dos cientistas naturalistas, estão dispostos a
reexaminar as Escrituras se algumas interpretações prévias da criação estiverem
baseadas em teorias que pareçam desacreditadas pelas pesquisas científicas.59
O criacionismo progressivo entende que os registros
fósseis preservados nas camadas geológicas são testemunhas silenciosas de
períodos de tempo bastante longos. Reconhecem, porém, que os fósseis descendem
em linha reta desde os tempos mais antigos.60 No tocante à teoria da
Terra jovem, certo criacionista progressivo diz: "Por ter deixado de
tratar de uma vasta quantidade de dados relevantes, o modelo da criação recente
com dilúvio global é incapaz... de explicar uma grande diversidade de fenômenos
geológicos".61
O criacionismo progressivo apresenta três fraquezas
principais. A primeira é que alguns dos seus proponentes confiam
demasiadamente na capacidade da ciência em reconhecer a verdade. Hugh Ross, por exemplo, oferece uma alternativa à
"opinião da revelação única" (a Bíblia como exclusiva fonte
autorizada da verdade): "uma teologia de dupla revelação" na qual a
Bíblia (uma das formas de revelação) é interpretada à luz do que a ciência
(outra forma igualmente autorizada de revelação) nos transmite.62 Em
resumo, esse modelo de criacionismo tende a violar o princípio sola scriptura da Reforma. Reconhece, no entanto, que "o teísmo cristão está em confronto direto com o monismo
naturalista da maioria dos evolucionistas". Empenha-se também em manter "a integridade
bíblica do relato de Gênesis". Muitos de seus adeptos rejeitam o conceito
de outros do mesmo arraial, que sustentam ser a revelação de Deus na natureza
tão autorizada quanto a da Bíblia. 63
A segunda fraqueza do criacionismo progressivo
relaciona-se com a primeira. Ao rejeitar o criacionismo fiat, por considerar que este se baseia numa ciência
obsoleta, permite o perigo de o pêndulo inclinar-se demais na direção oposta,
resultando numa hermenêutica dependente exageradamente da ciência hodierna.
Se tal acontecer, poderá produzir uma viúva teológica na geração seguinte - uma
interpretação teológica com base em uma teoria científica abandonada.64 O
filósofo evangélico J. P. Moreland lembra que a ciência existe em um estado
constante de fluxo. O que hoje é considerado certo pode não ser considerado
assim daqui a cinquenta anos. Moreland observa que a ciência tem mudado tanto
nesses últimos duzentos anos que não é correto atribuir mudança na maneira de a
ciência considerar o mundo e fornecer soluções aos seus problemas. Houve, na
verdade, um abandono total das teorias e maneiras antigas de a ciência olhar o
mundo, que foram substituídas por outras inteiramente novas - embora a
terminologia permaneça inalterada. O mesmo acontecerá às teorias atuais. 65
A terceira fraqueza do criacionismo progressivo é a
de consignar as camadas geológicas a vastas eras de deposição gradual, não
deixando nenhuma evidência clara para um dilúvio universal, a não ser a própria
Bíblia (Gn 6.7,13,17; 7.19-23; 8.9,21; 9.15,16). Muitos dos cientistas
evangélicos que adotam esse modelo sustentam a ideia de um dilúvio local. 66
Harmonizando
os conceitos. Se todas as tentativas
atuais para harmonizar a Bíblia com a ciência estão eivadas de dificuldades,
por que considerá-las? Em primeiro lugar, porque algumas questões precisam ser
respondidas, e estamos convictos de que, pelo fato de Deus ser consistente e
amar a verdade (Nm 23.19; Tt 1.2; Hb 6.18; 1 Jo 5.20; Ap 6.10), sua Palavra
concordará com o seu mundo. Em segundo lugar, a própria Bíblia parece apelar a
evidências para apoiar a crença (At 1.3; 1 Co 15.5-8; 2 Pe 1.16; 1 Jo 1.1-3). E
parece sugerir que devemos ter algo inteligente para dizer a respeito da
ciência e da Bíblia, se formos questionados (Cl 4.5,6; Tt 1.9; 1 Pe 3.15; Jd
3).
Mesmo com suas dificuldades, as tentativas
evangélicas de harmonizar os dados contribuem em muito para responder às perguntas dos crentes e dos incrédulos,
igualmente.67 De forma resumida, apresentamos seis doutrinas
primárias, com as quais são concordes todos esses modelos.
1. É impossível a geração espontânea da vida oriunda da
não-vida. Os que tentam criar a vida numa proveta usam meios de "armar o
jogo"68 desonestamente a seu favor.
2. Parece que as variações genéticas têm seus limites;
não ocorrem em todas as direções, e as mutações sempre são prejudiciais.
3. O processo da formação das espécies pode ser melhor
explicado pelo isolamento ecológico que por processos macroevolucionários.
4. O registro fóssil contém lacunas entre formas importantes
de organismos vivos, deixando de fornecer elos na cadeia evolutiva (elos que
estariam presentes aos milhares fosse verídico o evolucionismo).
5. A homologia (semelhanças observadas nos organismos
vivos) pode melhor ser explicada por um projeto inteligente e pelo reaproveitamento deliberado de padrões que por alegados ancestrais
em comum.
6. Quando os bioquímicos examinam a estrutura do DNA de vários organismos, encontram um padrão aleatório
na sua composição química, e não a progressão incremental que aumenta de acordo com a complexidade - conforme
exige o evolucionismo.
Sendo assim, o debate sobre o criacionismo tem gerado
várias respostas relevantes às questões propostas. Seria útil, no entanto, se
os proponentes de todos esses modelos reconhecessem que as Escrituras
realmente não falam de modo tão específico a apoiar integralmente um modelo.
Devemos tomar o cuidado de reconhecer plenamente o estado pecaminoso - caído -
da humanidade (Jr 17.9; 1 Co 2.14; Tt 1.15,16). O pensamento humano não pode
ser considerado uma capacidade neutra, objetiva e eficaz por si só, conforme
lembra Eta Linnemann,
que se converteu do método histórico-crítico de interpretação para a fé
salvífica: "A necessária regulamentação dos pensamentos deve ocorrer
através das Sagradas Escrituras. Elas controlam o processo intelectivo. Os
pensamentos devem subordinar-se à Palavra de Deus. Se as dificuldades surgirem,
o pensamento humano duvida da sua própria sabedoria, mas não da Palavra de
Deus".69 O Espírito Santo aplica a Palavra, e este princípio de
orientação sobreviverá aos estragos do tempo.
A Criação e a Natureza dos
Seres Humanos
Os propósitos de Deus não podem ser separados da sua
criação. Deus criou o Universo objetivando comunhão eterna com a humanidade. Os
escritores sagrados, de forma inequívoca, atribuem a criação - tudo que existe
e "não é Deus" - ao Deus trino
e uno. Sendo Deus Criador, somente Ele merece nosso reverente temor e adoração.
O fato de que o mesmo Deus está agora sustentando o Universo oferece-nos
confiança durante as provações da vida. Além disso, a cosmovisão bíblica (à
luz criacionista) afirma que a criação física é basicamente ordeira (tornando
possível a ciência) e benéfica à existência humana. Além disso, os seres
humanos são "bons" quando em relacionamento com Deus. E, finalmente,
a totalidade da criação está avançando na direção do clímax redentor em Jesus
Cristo, nos "novos céus e nova terra".
A Terminologia Bíblica para a Humanidade
Os escritores do Antigo Testamento tinham numerosos
termos à sua disposição ao descrever o ser humano. Talvez o mais importante,
que ocorre 562 vezes, seja 'adam.10 Esse termo refere-se à raça humana (tanto homens
quanto mulheres) como a imagem de Deus e o ápice da criação (Gn 1.26-28; 2.7).
A humanidade foi criada por aconselhamento divino especial (v. 26) - segundo o
tipo divino (vv. 26,27) - e colocada numa posição acima do restante da criação
(v. 28). Os escritores bíblicos empregavam a palavra 'adam para
conotar "humanidade" (substantivo) ou
"humano" (adjetivo). Menos frequentemente, a palavra se refere ao
homem individual, Adão. Outro termo genérico, encontrado 44 vezes no Antigo
Testamento, é 'enosh, cujo significado predominante
é "humanidade" (Jó
28.13; SI 90.3; Is
13.12). A palavra pode, às vezes, referir-se a um indivíduo, mas somente no
sentido mais geral (Is
56.2). O termo 'ish, que aparece 2.160 vezes no Antigo Testamento, é
mais específico. Indica um homem como indivíduo masculino ou marido, embora às
vezes usado para a "humanidade" de modo geral, especialmente para
distinguir entre Deus e o homem.71 Os escritores do Antigo
Testamento empregam o termo gever 66 vezes para retratar a juventude
e a força, e até o aplicam a mulheres e crianças. Uma palavra correlata, gibbor, tipicamente refere-se a homens fortes, guerreiros - ou heróis.
Passando
ao Novo Testamento, verificamos que o termo anthrõpos geralmente
significa a "humanidade" e faz distinção entre os seres humanos e os
animais (Mt
12.12), os anjos (1 Co4-9), Jesus Cristo (Gl 1.12; embora
Ele seja anthrõpos em Fp 2.7; 1 Tm 2.5) e Deus
(Jo 10.33; At 5.29). A
palavra anthrõpinos também
distingue a humanidade dos animais na ordem divina da criação (Tg 3.7) e
ocasionalmente assinala a distinção entre Deus e o ser humano (At 17.24,25; 1 Co 4.3,4). As
vezes, Paulo usa anthrõpinos ao
mencionar as limitações inerentes ao ser humano (Rm 6.19; 1 Co
2.13).72
Por
causa do uso genérico de termos como 'adam, 'enosh, e anthrõpos, os
crentes devem acautelar-se ao elaborar doutrinas que fazem distinção entre os
papéis masculinos e os femininos. Muitas vezes, as versões bíblicas omitem a
distinção entre os termos genéricos e os que especificam o sexo masculino.
Mesmo quando usados os termos específicos para o sexo masculino (tais como 'ish ou gever, no
Antigo Testamento, e anêr, no Novo
Testamento), o ensino não deve ser limitado a apenas um dos sexos, pois não
raro as palavras vão além do sentido restrito. A palavra "irmãos" (adelphoi), por
exemplo, normalmente um termo específico do sexo masculino, muitas vezes
inclui implicitamente as "irmãs".73
Os
escritores sagrados frequentemente descrevem os seres humanos
como criaturas pecaminosas, carentes de redenção. De fato, não podemos estudar
a humanidade na Bíblia de modo abstrato, pois as declarações a este
respeito "são sempre pronunciamentos parcialmente teológicos".74
Resumindo, os escritores retratam a humanidade a perverter o conhecimento de
Deus, em rebelião contra a sua lei (Gn 6.3,5; Rm 1.18-32; 1 Jo 1.10). Esta a
razão do apelo de Cristo ao arrependimento (Mt 9.13; Mc 1.15; Lc 15.7; Jo 3.15-18), sendo acompanhado nisto
por vários autores do Novo Testamento. Realmente, "Deus tem colocado os
seres humanos como enfoque da sua atenção, visando redimi-los para si mesmo e
habitar com eles para sempre". 75
A Origem da Raça Humana
Os escritores sagrados sustentam de modo consistente
que Deus criou os seres humanos. Os textos bíblicos mais precisos indicam que
Deus criou o primeiro homem diretamente do pó (úmido) da terra. Não há lugar
aqui para o desenvolvimento paulatino de formas mais singelas de vida em outras
mais complexas, tendo o ser humano como ponto culminante.76 Em
Marcos 10.6, o próprio Jesus declara: "Desde o princípio da criação, Deus
os fez macho e fêmea". Não pode haver dúvida quanto ao desacordo do evolucionismo com o registro bíblico. A Bíblia indica com clareza
que o primeiro homem e a primeira mulher foram criados à imagem de Deus, no
princípio da criação (Mc 10.6), e não formados no decurso de milhões de anos de
processos
macroevolucionários.
Num trecho curioso, Gênesis registra a criação especial
da mulher: "E da costela que o Senhor Deus tomou do homem formou uma
mulher; e trouxe-a a Adão" (2.22). A palavra original traduzida por
"costela" é tsela', termo
este que não é usado em outra parte do Antigo Testamento nesse sentido. Em
outros textos, significa o lado de uma colina, talvez um cume ou terraço (2 Sm
16.13), os lados da arca da aliança (Ex 25.12,14), uma câmara lateral de uma
construção (1 Rs
6.5; Ez 41.6) e as folhas de uma porta dobradiça
(1 Rs 6.34). Por isso, a palavra pode significar que Deus tomou parte do lado
de Adão, inclusive ossos, carne, artérias, veias e nervos, posto a afirmação
do próprio homem: "Esta é agora osso dos meus ossos e carne da minha
carne" (Gn 2.23). A mulher foi feita "da mesma matéria" que o
homem, compartilhava da mesma essência. Além disso, esse e outros textos deixam
claro que a mulher foi alvo direto da atividade criadora de Deus, da mesma
maneira que o homem.
Os Componentes Básicos dos Seres Humanos
Quais os componentes básicos dos seres humanos? A
resposta a esta pergunta usualmente inclui um estudo dos termos
"mente", "vontade", "corpo", "alma" e
"espírito". Realmente, os escritores sagrados empregam uma ampla variedade
de termos para descrever os componentes essenciais dos seres humanos.
A Bíblia menciona "coração",
"mente", "rins", "lombos", "fígado", o
"íntimo" e as "entranhas" como componentes das pessoas, que
contribuem para a capacidade distintivamente humana de reagir a certas
situações. Em hebraico, a palavra "coração" (lev, levav) era
usada no tocante ao órgão físico, porém mais frequentemente no sentido
abstrato, para descrever a natureza interior, a mente ou pensamentos íntimos,
os sentimentos ou emoções, os impulsos profundos e até mesmo a vontade. No Novo
Testamento, "coração" (kardia) também
significa o órgão físico, mas primariamente a vida interior com suas emoções,
pensamentos e vontade, bem como a habitação do Senhor e do Espírito Santo.
Os escritores do Antigo Testamento também empregavam
o termo kilyah ("rins")
para referir aos aspectos íntimos, secretos da personalidade. Jeremias, por
exemplo, lamenta diante de Deus os seus compatriotas insinceros: "Tu
sempre estás nos seus lábios, mas longe dos seus rins" (Jr 12.2, literal).
No Novo Testamento, nephroi ("rins") é usado
uma só vez (Ap 2.23), quando Jesus adverte o anjo da igreja em Tiatira: "E
todas as igrejas saberão que eu sou aquele que sonda os rins e os
corações" (ARA).
Às vezes, os escritores do Novo Testamento descrevem
uma atitude com a palavra splanchna
("entranhas"; ou
"coração", 1 Jo 3.17). Jesus "teve compaixão" da multidão
(Mc 6.34; ver também 8.2). Em certo lugar, splanchna parece
formar um paralelo com kardia
(2 Co 6.12); ou ocorre onde
poderíamos esperar a palavra pneuma
("espírito", 2 Co 7.15).
O Novo Testamento menciona ainda a "mente" (nous, dianoia) e
a "vontade" (thelema,
boulema, boulesis). A "mente"
denota a faculdade da percepção intelectual, bem como a capacidade de fazer
julgamentos morais. Em certas ocorrências no pensamento grego, parece formar
um paralelo com o termo "coração" (lev) do
Antigo Testamento. Em outros trechos, parece que os gregos distinguiam os dois (ver Mc 12.30). Ao considerar a
"vontade," a "vontade ou volição humana
pode ser representada, por um lado, como um ato da mente que se dirige a uma
escolha livre. Mas, por outro lado, pode ser motivada por um desejo que provém pressuroso do inconsciente".77 Posto que os
escritores sagrados usavam esses termos de várias maneiras (assim como fazemos
na linguagem cotidiana), é difícil determinar com precisão, pelas Escrituras,
onde termina a "mente" e começa a "vontade".
Observe que muitos dos termos estudado são um tanto
ambíguos, e certamente coincidem parcialmente entre si em algumas ocasiões.
Agora, nosso estudo passa aos termos "corpo", "alma" e
"espírito". E possível incorporar todos os termos já mencionados em
componentes como "alma" e "espírito"? Ou é artificial
semelhante divisão, podendo-se esperar, no máximo, uma divisão material/imaterial?
Os escritores sagrados tinham uma ampla variedade de
termos relativos ao "corpo". Para os hebreus, "carne" (basar, she'er) e "alma" (nephesh) podiam
significar corpo (Lv 21.11; Nm 5.2, onde o significado parece ser
"cadáver"). "Força" (me'od)
dizia respeito ao poder físico do
corpo (Dt 6.5). Os escritores do Novo Testamento mencionam a "carne" (sarx, que às vezes significava o corpo físico), a
"força" (ischus) do
corpo (Mc 12.30) ou, mais frequentemente, o "corpo" (soma), que
ocorre 137 vezes.
Quanto a alma, o termo primário dos hebreus era nephesh,
que ocorre 755 vezes no Antigo
Testamento. Mais frequentemente, esse termo abrangente significa meramente
"vida", "próprio-eu", "pessoa" (Js 2.13; 1 Rs
19.3; Jr 52.28). Quando usado nesse sentido amplo, nephesh descreve
o que somos: almas, pessoas (neste sentido, não "possuímos" alma ou
personalidade).78 Às vezes nephesh
podia significar a
"vontade" - ou "desejo" - de uma pessoa (Gn 23.8; Dt
21.14). Ocasionalmente, porém, destaca aquele elemento nos seres humanos que
possui vários apetites: a fome física (Dt 12.20), o impulso sexual (Jr 2.24) e
o desejo moral (Is
26.8,9), no Antigo Testamento. Em Isaías
10.18 nephesh ocorre juntamente com "carne"
(basar), aparentemente para denotar
a pessoa inteira. 79
Os escritores do Novo Testamento
usaram psuchê 101 vezes
para descrever a alma humana. No pensamento grego, a "alma" pode ser: (1) a sede
da vida, ou a própria vida (Mc 8.35); (2) a parte interna do ser
humano, equivalente ao ego, à pessoa ou à personalidade (a Septuaginta traduz o
heb. lev — "coração" - por psuchê 25 vezes);
ou (3) a alma
por contraste com o corpo. O termo psuchê, como
elemento conceituai dos seres humanos, provavelmente significa
"discernimento, vontade, disposição, sensações, poderes morais"80
(Mt 22.37). Não é
fácil, porém, traçar linhas divisórias definitivas entre os muitos significados
dessa palavra.
O termo ruach é
"espírito", encontrado 387 vezes no Antigo
Testamento. Embora o significado básico seja "ar em movimento",
"vento", "sopro", "hálito", ruach também
denota "a totalidade da consciência imaterial do homem" (Pv 16.32; Is 26.9). Em
Daniel
7.15, ruach está
contido no seu invólucro, o "corpo".81 J. B. Payne indica
que tanto nephesh quanto ruach podem
partir do corpo na ocasião da morte e, mesmo assim, existir num estado separado
dele (Gn
35.18; SI 86.13). 82
No Novo
Testamento, o termo pneuma basicamente
significa "vento" ou "hálito", referindo-se ao
"espírito" de um homem ou de uma mulher. E o poder que as pessoas
experimentam e que as relacionam com "o âmbito espiritual, a dimensão da
realidade que jaz além da observação comum e do controle humano". O
espírito, portanto, vincula os seres humanos ao mundo espiritual e os ajuda a
interagir nessa dimensão. Em outras ocorrências, porém, por ocasião da morte, o
espírito se afasta, e o corpo cessa de representar a pessoa inteira (Mt 27.50; Lc 23.46; At 7.59). 83
Depois
desta breve resenha de termos bíblicos, permanecem algumas perguntas: Quais os
elementos constituintes mais fundamentais dos seres humanos? Todos os termos
aqui estudados podem ser classificados segundo a divisão "corpo, alma e
espírito"? Devemos contrastar apenas o material com o imaterial? Ou
devemos considerar que os seres humanos são uma unidade e, portanto, indivisíveis?
O tricotomismo. Os tricotomistas sustentam que o ser humano é
constituído de três elementos: corpo, alma e espírito. A composição física dos
seres humanos é a parte material da sua constituição que os une aos demais
seres
viventes, inclusive as plantas e os
animais. As plantas, os animais, os seres humanos, todos podem ser descritos em
termos de existência física.
A "alma" é considerada o princípio da vida
física ou animal. Os animais possuem uma alma básica e rudimentar: apresentam
evidências de emoções e são descritos com o termo psuchê em
Apocalipse 16.3 (ver também Gn 1.20, onde são descritos como nephesh chayyah, "de
alma vivente" no sentido de "indivíduos vivos" dotados
de certa medida de personalidade). Os seres humanos e os animais são distintos
das plantas, em parte pela capacidade de expressar sua personalidade
individual.
O "espírito" é considerado um poder sublime
que estabelece os seres humanos na dimensão espiritual e os capacita à
comunhão com Deus.5 Pode-se distinguir o espírito da alma, sendo
aquele "a sede das qualidades espirituais do indivíduo, ao passo que nesta
residem os traços da personalidade". Embora distintos entre si, não é
possível separar alma e espírito. Pearlman
declara: "A alma sobrevive à morte porque é energizada pelo espírito, mas
alma e espírito são inseparáveis porque o espírito está entretecido na própria textura da alma. São fundidos e caldeados numa só substância". 84
Textos bíblicos que parecem apoiar o tricotomismo incluem
1 Tessalonicenses 5.23, onde Paulo pronuncia a bênção: "E todo o vosso
espírito, e alma, e corpo sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a
vinda de nosso Senhor Jesus Cristo". Em 1 Coríntios 2.14-3.4, Paulo refere-se aos seres humanos como sarkikos (literalmente:
"carnal" 3.1,3), psuchikos (literalmente:
"segundo a alma", 2.14) e pneumatikos (literalmente:
"espiritual", 2.15). Esses dois textos parecem demonstrar de forma
ostensiva três componentes elementares. Vários outros textos parecem distinguir
alma e espírito (1 Co 15.44; Hb 4.12).
O tricotomismo é bastante popular nos círculos conservadores.
H. O.
Wiley, porém, indica que erros
podem ocorrer quando seus vários componentes ficam fora de equilíbrio. Os gnósticos, antigo grupo religioso sincretista que adotava
elementos tanto do paganismo quanto do Cristianismo, sustentavam que, se o
espírito emanava de Deus, era imune ao pecado. Os Apolinarianos, grupo herético
do século IV condenado por vários concílios
eclesiásticos, acreditavam que Cristo possuía corpo e alma, mas que o espírito
humano fora substituído pelo Logos
divino. Placeu (1596-1655 ou
1665), da Escola de Samur,
na França, ensinava que somente o pneuma
era criado diretamente por Deus. A
alma, dizia, era mera vida animal e perecia com o corpo. 85
O dicotomismo.
Os dicotomistas sustentam apenas
dois elementos constituintes dos seres humanos: o material e o imaterial. Observam que, nos dois Testamentos, as palavras
"alma" e "espírito" às vezes são usadas de modo
intercambiável. Parece que assim ocorre com a colocação paralela de
"espírito" e "alma" em Lucas 1.46,47: "A minha alma
engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador"
(ver também Jó
27.3). Muitos texto bíblicos parecem subentender uma dupla divisão nos seres
humanos, sendo que "alma" e "espírito" são usados como
sinônimos. Em Mateus 6.25, o Senhor Jesus adverte: "Não andeis cuidadosos
quanto à vossa vida [psuchê], pelo que haveis
de comer ou pelo que haveis
de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir". Em Mateus 10.28, Ele diz: "Não
temais os que matam o corpo e não podem matar a alma". Em 1 Coríntios 5.3, porém, Paulo fala em estar "ausente no
corpo" (soma) mas "presente no espírito" (pneuma), sendo
que os dois aspectos aparentemente abrangem a pessoa total. Além disso, há
ocasiões em que perder o pneuma
significa-morrer (Mt 27.50; Jo
19.30), assim como perder a psuchê
envolve a morte (Mt 2.20; Lc
9.24).
A dicotomia
é "provavelmente o conceito mais sustentado no decurso da maior parte da
história do pensamento cristão".86 Seus adeptos, assim como
acontece entre os tricotomistas, têm a capacidade de declarar e defender suas
opiniões sem cair em erros doutrinários. Pearlman declara: "Os dois pontos
de vista são corretos, sendo devidamente compreendidos".87
Quando, porém, os componentes do dicotomismo perdem o equilíbrio, podem surgir
erros.
Os gnósticos
adotavam um dualismo cosmológico, cujo impacto sobre o seu conceito dos seres
humanos era significativo. Diziam que o Universo estava dividido entre um lado
imaterial, espiritual, que era intrinsecamente bom, e um lado material, físico, intrinsecamente mau. Um abismo intransponível fazia a separação
entre esses dois. aspectos do Universo. Paradoxalmente, os seres humanos eram
formados por esses dois componentes. Como consequência dessa natureza dualista, os seres humanos podiam optar por um destes dois
comportamentos: (1) pecar à vontade, pois o espírito bom nunca será maculado
pelo corpo mau; (2) castigar o corpo mediante disciplinas ascéticas, por ser
ele mau.
Na era moderna, Erickson cita erros doutrinários dentro da teologia liberal,
tais como: (1) alguns liberais acreditam não ser o corpo parte essencial da
natureza humana, ou seja, a pessoa pode funcionar muito bem sem ele; (2)
alguns liberais chegam ao ponto de apontar a ressurreição da alma em
substituição à doutrina bíblica da ressurreição do corpo. 88
O monismo. O
monismo, também uma cosmovisão, remonta "aos filósofos pré-socráticos que
apelavam a um único princípio unificador
para explicar toda a diversidade da experiência observada".89
No entanto, pode adotar um enfoque muito mais estreito, e o faz quando se
aplica ao estudo dos seres humanos. Os monistas teológicos argumentam que os
vários componentes dos seres humanos descritos na Bíblia perfazem uma unidade
indivisível e radical. Parcialmente, o monismo era uma reação neo-ortodoxa ao
liberalismo, que havia proposto uma ressurreição da alma, mas não a do corpo.
Veremos, porém, que o monismo, ao reagir corretamente contra o erro do
liberalismo, apresenta seus próprios problemas.
Os monistas defendem que, onde o Antigo Testamento
emprega a palavra "carne" (basar),
os escritores do Novo Testamento
aparentemente empregam tanto "carne" (sarx) quanto "corpo" (soma). Qualquer
desses termos pode referir-se ao ser humano inteiro porque, nos tempos
bíblicos, ele era considerado um ser unificado. Segundo o monismo, pois, devemos
considerar o ser humano como um todo unificado, e não como vários componentes
que podem ser individualmente identificados e classificados. Quando os
escritores sagrados falam de "corpo e alma... deve-se
considerar uma descrição exaustiva da-personalidade humana. No conceito do
Antigo Testamento", cada pessoa individual "é uma unidade
psicofísica, carne animada pela alma". 90
A
dificuldade do monismo, obviamente, é o fato de não deixar lugar para um estado
intermediário entre a morte a ressurreição física no futuro. Esse ponto de
vista discorda de numerosos textos bíblicos.91 Jesus também faz
clara referência ao corpo e à alma como elementos divisíveis quando adverte:
"Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma" (Mt 10.28).
Tendo
passado em revista várias opiniões a respeito do ser humano e observado
possíveis erros dentro de cada posição, estamos prontos a formular uma
síntese. Os escritores sagrados, segundo parece, empregam os termos de várias
maneiras. "Alma" e "espírito" às vezes parecem sinônimos, ao passo
que em outras ocasiões se apresentam distintos. Vários termos bíblicos, na
realidade, parecem descrever a totalidade da pessoa humana, ou do próprio-eu,
inclusive "homem", "carne"', "corpo" e
"alma", bem como o substantivo composto "carne e sangue".
O Antigo Testamento, talvez mais obviamente que o Novo, vê a pessoa individual
como um ser unificado. Os seres humanos são humanos por causa de tudo quanto
são. Fazem parte do mundo espiritual e podem relacionar-se com a
realidade espiritual. São criaturas com emoções, vontade e moral. Fazem parte
do mundo físico e podem, portanto, ser identificados como "carne e
sangue" (Gl 1.16; Ef 6.12; Hb 2.14). O corpo
físico, criado por Deus, não é inerentemente mau (era o que os gnósticos
argumentavam, e parece que alguns cristãos assim acreditam hoje).
O ensino
bíblico a respeito da natureza pecaminosa do ser humano caído é que todo ele
está
afetado, não apenas uma parte. 92 Além disso, os
seres humanos -
conforme os conhecemos e a Bíblia identifica - não
podem herdar o Reino de Deus (1 Co 15.50). Em
primeiro lugar, é necessária uma mudança essencial. Acrescente-se que,
quando o componente imaterial
do ser humano parte, por ocasião da morte, nenhum dos dois elementos em
separado pode ser descrito como um ser humano. O que permanece na terra é um
cadáver, e o que partiu a estar com Cristo, um ser desencarnado, imaterial, ou espírito (que tem existência consciente pessoal,
mas não "plenamente humana"). Na ressurreição do corpo, o espírito
será reunido com um corpo ressurreto, transformado e imortal (1 Ts 4.13-17), e,
mesmo assim, nunca mais será considerado humano, na concepção atual (1 Co
15.50).
Considerar o ser humano uma unidade condicional resulta
em várias implicações. Primeira: o que afeta um elemento do ser humano afeta a
pessoa inteira. A Bíblia vê a pessoa como um ser global, "e o que toca
numa parte afeta a totalidade". Em outras palavras, uma pessoa portadora
de doença crônica (no corpo) por certo terá afetadas as emoções e a mente e
até o canal da comunhão normal com Deus. Erickson
observa: "O cristão que deseja ter saúde espiritual dedicará atenção a
questões tais como a dieta, o repouso e o exercício".93 De modo
semelhante, a pessoa que sofre certas pressões mentais poderá manifestar
sintomas físicos ou até mesmo doenças físicas.
Segunda: os conceitos bíblicos de salvação e santificação não devem ser considerados como a redução do corpo
mau à escravidão do espírito bom. Quando os escritores do Novo Testamento
mencionam a "carne" num sentido negativo (Rm 7.18; 8.4; 2 Co 10.2,3;
2 Pe 2.10), falam da natureza pecaminosa, e não especificamente do corpo
físico. No processo da santificação,
o Espírito Santo renova a pessoa inteira. De fato, somos inteiramente uma
"nova criatura" em Cristo Jesus (2 Co 5.17).
A Origem da Alma
Ninguém no campo da medicina ou da biologia discute a
origem do corpo físico do ser humano. Na concepção, quando o espermatozóide se une ao óvulo, a molécula de DNA deste desenrola-se e une-se à daquele, formando uma
célula inteiramente nova (zigoto).
Essa nova célula viva é tão diferente que, depois de se afixar à parede uterina, o corpo da mãe reage, enviando anticorpos para
eliminar o intruso
não reconhecido. Somente alguns aspectos especiais e inatos do novo organismo o
guardam da destruição. 94
Por isso é incorreta a expressão "meu
corpo", empregada pelas defensoras do aborto quando falam do embrião ou do
feto - em qualquer estágio. O organismo desenvolvido no útero da mãe é, na realidade, um corpo individual,
diferente. A partir da concepção, esse corpo distinto produzirá mais células, e
todas elas manterão o padrão único dos cromossomos do zigoto original. Está claro, portanto, que o corpo humano
tem sua origem no ato da concepção.
A origem da alma é mais difícil de ser determinada.
Visando os propósitos do estudo que se segue, definiremos "alma" como
a totalidade da natureza imaterial
do ser humano (que abrange os termos bíblicos "coração",
"rins", "entranhas", "mente", "alma",
"espírito" etc). As teorias da origem da alma que buscam bases na
Bíblia95 são três: a preexistência, o criacionismo (Deus cria
diretamente cada alma) e o traducianismo (cada alma é derivada da alma dos
pais).
A teoria da preexistência. Segundo esta teoria, uma alma criada por Deus em
tempos passados entra no corpo humano em algum momento do desenvolvimento
inicial do feto. Mais especificamente, a alma de cada pessoa tinha existência
consciente e pessoal num estado prévio. Essas almas pecam, em vários graus,
nesse estado preexistente, e por isso são condenadas a "nascer neste mundo
num estado de pecado e em conexão com um corpo material". O proponente
cristão mais importante desse ponto de vista foi Orígenes, o teólogo de
Alexandria (c. de 185 - c. de 254). Ele sustentava que o estado presente da
existência que observamos agora (o indivíduo alma/corpo) é apenas uma etapa na
existência da alma humana. Hodge
aprimora o conceito de Orígenes: "Tem passado por inúmeras outras épocas e
formas de existências anteriores, e ainda há de passar por incontáveis épocas
semelhantes no futuro". 96
Devido às suas dificuldades insuperáveis, a teoria da
preexistência nunca conquistou muitos adeptos. (1) Baseia-se na noção pagã de que o corpo é inerentemente mau e, portanto, uma
forma de castigo para a alma. (2) A Bíblia nunca
menciona a criação de seres humanos anteriores a Adão ou qualquer apostasia da
humanidade antes da queda, em Gênesis 3. (3) A Bíblia jamais
atribui nossa presente condição a alguma causa anterior ao pecado de nosso primeiro
pai, Adão (Rm 5.12-21; 1 Co 15.22).
A teoria
do criacionismo. De acordo com esta teoria,
"cada alma individual deve ser considerada uma criação imediata de Deus,
que deve sua origem á um ato criador direto".97 A
cronologia
exata da criação da alma e de sua união com o corpo não é
assunto levantado nas Escrituras (por essa razão, as análises dos proponentes e
antagonistas dessa teoria são um pouco vagas). Entre
os adeptos da teoria do criacionismo estão Ambrósio, Jerônimo, Pelágio,
Anselmo, Aquino e a maioria dos teólogos católicos romanos e reformados. As
evidências bíblicas usadas para reforçá-la são os textos que atribuem a Deus a
criação da "alma" e do "espírito" (Nm 16.22; Ec 12.7; Is 57.16; Zc 12.1; Hb 12.9).
Alguns
dos que a rejeitam argumentam que as Escrituras também asseveram que Deus criou
o corpo (SI
139.13,14; Jr 1.5).
"Não hesitamos, porém, em interpretar esses últimos textos como expressões
da criação mediata, e não imediata", diz Augustus Strong. 98
Além disso, a teoria do criacionismo não leva em conta a tendência inerente das
pessoas ao pecado.
O
traducianismo. Strong cita Tertuliano, o teólogo
africano (c. de
160 - c. de 230), Gregório de Nyssa (330 - c. de 395) e
Agostinho
(354-430), que comentaram favoravelmente o
traducianismo,99 embora nenhum deles forneça uma explicação
integral. Mais recentemente, os reformadores luteranos, de modo geral,
aceitavam o traducianismo. O termo "traduciano" provém do verbo
latino traducere ("levar ou trazer por
cima", "transportar", "transferir"). Sustenta que
"a raça humana foi criada imediatamente em Adão, no que diz respeito à
alma como também ao corpo, e que ambos são propagados da parte dele para a geração
natural".100 Em outras palavras, Deus outorgou a Adão e Eva os
meios pelos quais eles (e todos os seres humanos) teriam descendentes à sua
própria imagem, perfazendo, assim, a totalidade da pessoa material-imaterial.
Gênesis
5.1 registra: "No dia em que Deus criou o homem, à semelhança de Deus o
fez". Por contraste, Gênesis 5.3 declara: "E Adão viveu cento e
trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem".
Deus outorgou a Adão e Eva
a capacidade de gerar filhos de composição semelhante à deles mesmos. E, na
declaração de Davi: "Em pecado me concebeu minha mãe" (SI 51.5),
temos evidências de que ele herdou dos pais, ao ser concebido, uma alma com
tendência ao pecado. Finalmente, em Atos 17.26, Paulo declara: "Deus... de
um só fez toda a geração dos homens", que subentende que tudo quanto se
constitui em "humanidade" provém de Adão. Para os proponentes do
traducianismo, o aborto, em qualquer etapa do desenvolvimento do zigoto, do embrião ou do feto significa pôr fim a uma vida plenamente
humana.
Os oponentes do traducianismo objetam que, se os pais
geram uma alma assim como um corpo, aquela é reduzida a uma substância
material. Os traducianistas respondem que este fato não leva necessariamente a
essa conclusão. A própria Bíblia não demonstra com exatidão o processo de procriação da alma. Os mesmos oponentes argumentam também que
o traducianismo estaria afirmando que Cristo participou da natureza pecaminosa
ao nascer de Maria. Os traducianistas respondem que o Espírito Santo santificou o que Jesus recebeu da parte de Maria, protegendo-o
de qualquer sinal de tendência pecaminosa. 101
A Unidade da Humanidade
A doutrina da unidade da humanidade prega que todos
os seres humanos, masculinos e femininos, de todas as raças, tiveram sua origem
em Adão e Eva (Gn 1.27,28; 2.7,22; 3.20; 9.19; At 17.26). Que
tanto os homens quanto as mulheres estão inclusos na imagem de Deus, está claro
em Gênesis 1.27: "Macho e fêmea os criou" (ver também Gn 5.1,2). A
lição é que todos os seres humanos, de ambos os sexos e pertencentes a todas as
raças, classes econômicas e faixas etárias, levam igualmente a imagem divina e,
portanto, são de igual valor aos olhos de Deus.
Desde que a Bíblia revela terem sido os dois sexos da
raça humana feitos à imagem de Deus, não há justificativa para os homens
considerarem inferiores as mulheres. A palavra "adjutora" (Gn 2.18) também
é usada
frequentemente (traduzida como
"ajuda") a respeito do próprio Deus (Ex 18.4) e não
indica uma categoria inferior.102 Além disso, quando o Novo
Testamento coloca a esposa em subordinação funcional ao marido (Ef 5.24; Cl 3.18; Tt 2.5; 1 Pe 3.1), não
significa que a mulher seja inferior ao homem, nem que essa subodinação seja
geral. O padrão neotestamentário é que a esposa esteja subordinada ao seu
próprio marido. 103
O verbo "sujeitar-se" (grego hupotassõ),
empregado nos quatro textos referentes à submissão,
também é empregado em 1 Coríntios 15.28, onde
Paulo declara que o Filho "se sujeitará" ao Pai.104 Mesmo
assim, todos os crentes entendem aqui uma sujeição administrativa - o
filho, de modo algum, é inferior ao pai. O mesmo pode ser dito dos textos a
respeito da esposa e do marido. Embora Deus tenha ordenado papéis funcionais
diferentes aos vários membros da família, a nenhum desses membros se atribui
valor menor que o do seu líder administrativo. Realmente, o apóstolo Paulo
ensina que em Cristo "não há macho nem fêmea" (Gl 3.28). As
bênçãos, promessas e provisões do Reino de Deus estão à disposição de todos,
igualmente.
O
racismo torna-se
insustentável ao se levar em conta a origem da raça humana em Adão e Eva. Pelo
contrário, são outras as distinções que a Bíblia focaliza. Por exemplo, os
escritores do Antigo Testamento mencionam "semente",
"descendente" (zera'); "família",
"clã", "parentela" (mishpachah); "tribo"
(matteh, shavet), para as
divisões gerais pela linhagem biológica; e "língua" (lashon), para
divisões por idioma. Seguindo um padrão semelhante, os escritores do Novo
Testamento mencionam "descendente", "família", "nacionalidade"
(genos); "nação" (ethnos);
e "tribo" (phulê).
Os
escritores bíblicos não tinham absolutamente preocupação com a raça, como
distinção entre cor e textura dos cabelos, cor da pele e dos olhos, estatura,
proporções físicas e coisas semelhantes. M. K. Mayers conclui: "A Bíblia
não se refere ao termo 'raça'; e nenhum conceito de raça é desenvolvido na
Bíblia". Por isso, os mitos raciais de que a maldição de Caim trouxe ao
mundo a raça negra, ou que a maldição
de Cão era ficar com a pele escura, devem ser rejeitados.105 Ao
invés, Gênesis 3.20 simplesmente declara: "E chamou Adão o nome de sua
mulher Eva, porquanto ela era a mãe de todos os viventes".
No Novo Testamento, o evangelho de Cristo invalidou
todas as distinções entre os seres humanos - que existiam no século I d.C.
Incluíam divisões entre judeus e samaritanos (Lc 10.30-35); judeus e gentios (At 10.34,35; Rm 10.12); judeus e incircuncisos,
bárbaros e citas (Cl 3.11); homens e mulheres (Gl 3.28); escravos e livres (Gl
3.28; Cl 3.11). Em Atos 17.26 Paulo declara: "Deus... de um só fez toda a
geração dos homens para habitar sobre toda a face da terra". No versículo
seguinte, o apóstolo revela o propósito de Deus nesse ato criador: "...
para que buscassem ao Senhor, se, porventura, tateando, o pudessem achar"
(17.27). A luz de textos bíblicos como estes, não resta a mínima possibilidade
de se sustentar uma teoria racista baseada em algum suposto apoio da Bíblia.
Finalmente, não há maneira de se estabelecer
categorias de valor humano com base nas condições econômicas ou na idade. O
propósito de Deus para a humanidade é que conheçamos, amemos e sirvamos a Ele.
Deus nos criou "com a capacidade de conhecê-lo. Essa é a característica
distintiva fundamental... que toda a humanidade tem em comum".106 Por
isso, qualquer avaliação ou classificação do valor intrínseco de algum grupo
de seres humanos deve ser rejeitada como artificial e antibíblica.
A Imagem de Deus nos Seres Humanos
A Bíblia afirma que os seres humanos foram criados à
imagem de Deus. Gênesis 1.26 registra as palavras do Criador: "Façamos o
homem ['adam - "humanidade"] à nossa imagem, conforme a
nossa semelhança" (ver também 5.1). Outros textos bíblicos demonstram com
clareza que os seres humanos, embora descendentes de Adão e Eva e já caídos (ao invés de criados diretamente por
Deus), continuam a levar a imagem de Deus (Gn 9.6; 1 Co 11.7; Tg 3.9).
Os termos hebraicos em Gênesis 1.26 são tselem e demuth. Tselem, empregado
16 vezes no Antigo Testamento, refere-se basicamente a uma imagem ou modelo
funcional. Demuth, empregado 26 vezes, refere-se, de modo variado, a
semelhanças visuais, audíveis e estruturais num desenho, padrão ou forma.
Esses termos parecem estar explicados na continuação (vv. 26-28), quando a
humanidade recebe poder para subjugar a Terra (ou seja, controlá-la pelo
conhecimento, por saber aproveitá-la) e governar (de modo benéfico) as demais
criaturas (ver também SI 8.5-8).
O Novo Testamento emprega as palavras eikõn (1
Co 11.7) e homoiõsis (Tg 3.9). Eikõn
geralmente significa "imagem",
"semelhança", "forma" ou "aparência" em toda a
sua gama de usos. Homoiõsis
significa "semelhança",
"correspondência", "aparência semelhante". Posto que os
termos, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, parecem ter sentido amplo e
intercambiável, devemos olhar para além dos estudos lexicógrafos a fim de
determinar a natureza da imagem de Deus.
Antes de afirmarmos o que é a imagem de Deus, explicaremos
resumidamente o que ela não é. A imagem de Deus não é uma semelhança física -
opinião esta abraçada pelos mormons e por Swedenborg. A Bíblia declara que
Deus, que é Espírito onipresente, não pode ser limitado a um corpo físico (Jo
1.18; 4.24; Rm 1.20; Cl 1.15; 1 Tm
1.17; 6.16). O Antigo Testamento utiliza, de fato, termos como "o dedo de
Deus" ou o "braço de Deus" para expressar o seu poder. Também
fala de suas "asas" e "penas" para expressar o seu cuidado
protetor (SI 91.4). Esses termos, porém, são antropomorfismos, figuras de
linguagem empregadas para retratar algum aspecto da natureza ou do amor de
Deus.107 Deus advertiu Israel de que não deveria fazer imagens para
adorar, pois quando Ele falou ao seu povo, no Horebe (monte Sinai), não foi
vista "semelhança nenhuma" (Dt 4.15). Qualquer forma física seria
contrária ao que Deus realmente é.
Outro erro, talvez uma versão moderna da mentira da
serpente em Gênesis 3.5, é que a imagem de Deus faz dos seres humanos
"pequenos deuses".108 Certamente, "a exegese e a
hermenêutica sadias são, e sempre serão, o único antídoto eficaz contra muitas
doutrinas 'novas', a maioria das quais não passam de heresias antigas". 109
Identificadas
as posições a serem evitadas, atentemos para o conceito bíblico. Vários textos
do Novo Testamento oferecem alicerce à nossa definição de imagem de Deus na
pessoa humana. Em Efésios 4-23,24, Paulo relembra aqueles
crentes de que foram ensinados assim: "Que vos renoveis no espírito do
vosso sentido, e vos revistais do novo homem, que, segundo Deus, é criado em
verdadeira justiça e santidade". Em outro trecho, o apóstolo diz que a
razão de fazermos escolhas morais apropriadas está em nos vestirmos do novo
homem, "que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o
criou" (Cl
3.10).
Esses
versículos indicam que a imagem de Deus pertence à nossa natureza moral-intelectual-espiritual.
Explicando melhor: a imagem de Deus na pessoa humana é algo que somos, e não
algo que temos ou fazemos. Esta opinião está em perfeito acordo com o que já
estabelecemos como propósito de Deus na criação da humanidade. Primeiro: o
homem foi criado para conhecer, amar e servir a Deus. Segundo: relacionamo-nos
com outros seres humanos e temos a oportunidade de exercer o domínio
apropriado sobre a criação de Deus. A imagem de Deus em nós ajuda-nos a fazer exatamente essas
coisas.
Wiley, chamando
nossa atenção à natureza específica da imagem de Deus, distingue entre a
"imagem natural ou essencial de Deus no ser humano" e a "imagem
moral ou incidental de Deus que existe no ser humano".110 Com
"imagem natural de Deus" queremos dizer o que é essencialmente
humano nos seres humanos e que, portanto, os distingue dos animais. Isto inclui
a espiritualidade, ou a capacidade de reconhecer e ter comunhão com Deus. Além
disso, Colos-senses 3.10 afirma que a imagem de
Deus inclui o conhecimento, ou o intelecto, por meio do qual temos a
capacidade incomparável de manter comunicação inteligente com Deus e uns com os
outros - com uma
qualidade totalmente desconhecida no mundo animal. 111
Somente
os seres humanos, na criação de Deus, possuem a virtude da imortalidade. Mesmo
depois de rompida a comunhão entre Deus e a humanidade, na Queda (Gn 3), a cruz
de Cristo provideciou meios que possibilitam a comunhão com Deus por toda a
eternidade. Finalmente, segundo o contexto de Gênesis 1.26-28, a imagem
de Deus inclui, sem dúvida, um domínio provisório (com a responsabilidade de
cuidar devidamente) sobre as criaturas da Terra.
A
respeito da imagem moral de Deus nos seres humanos, "Deus fez ao homem reto" (Ec 7.29). Até
mesmo os pagãos, que não possuem conhecimento da lei escrita de Deus, conservam
uma lei moral escrita por Ele em seus corações (Rm 2.14,15). Em
outras palavras, somente os seres humanos possuem a capacidade de sentir o que
é certo e errado, bem como o intelecto e a vontade necessários para escolher
entre eles. Por esta razão, os seres humanos são chamados livres agentes
morais.
Diz-se também que possuem autodeterminação. Efésios 4.22-24 parece
indicar que a imagem moral de Deus, embora não completamente erradicada na
Queda, foi
afetada negativamente até certo ponto. Para ter restaurada a
imagem moral "em verdadeira justiça e santidade", o pecador precisa
aceitar a Cristo e se tornar uma nova criação.
Vale a
pena mencionar mais uma palavra a respeito da liberdade volitiva desfrutada
pelos seres humanos. Estes, mesmo possuindo tal liberdade, são incapazes de
escolher a Deus.112 Deus, portanto, pela sua bondade, equipa as
pessoas com uma medida de graça que as capacita e prepara a corresponder ao
Evangelho (Jo
1.9; Tt 2.11). O propósito de Deus era
ter comunhão com as pessoas que de livre vontade resolvessem aceitar sua
chamada universal à salvação. Em conformidade com esse propósito divino, Deus
outorgou aos seres humanos a capacidade de aceitá-lo ou rejeitá-lo. A vontade
humana foi liberta o suficiente para "voltar-se para
Deus",
"arrepender-se" e "crer".113
Logo, quando cooperamos com o Espírito que nos chama e aceitamos a Cristo, essa
cooperação não é o meio da renovação. Pelo contrário, é o fruto da renovação.
Para os crentes bíblicos de todas as denominações, a salvação é cem por cento
externa (uma dádiva imerecida de um Deus gracioso). Deus nos tem dado
graciosamente aquilo que necessitamos para cumprir o seu propósito na nossa
vida: conhecer, amar e servir a Ele.
Capítulo 7
1.
Frank E.
Gaebelein, ed., The Expositor's Bible
Commentary, vol. 12 (Grand Rapids:
Zondervan Publishing House, 1981), 498. Explica o mistério de Ap 10.7 com
"os propósitos de Deus para o homem e para o mundo, conforme foram revelados
aos profetas do AT e do NT".
2. H. Orton Wiley, Christian Theology, vol. 1 (Kansas City: Beacon Hill Press, 1940), 447.
3. Ver T. Vincent, The Shorter Catechism
Explained from Scripture (Edimburgo:
Banner of Truth Trust, 1980 no texto de 1674), 13.
4.
Bruce K.
Waltke, "The Literary Genre of Genesis, Chapter One", Crux 27.4. (Dezembro
de 1991),
3.
5.
T. E. McComiskey,
'"asa", Dicionário Teológico do
Antigo Testamento, vol. 2, R. Laird
Harris, Gleason L. Archer, Jr., e Bruce K. Waltke,
eds.;
trad, vários; rev. Gordon Chown (São
Paulo: Edições Vida Nova, 1996).
6.
Ibid. Bara' em
todas as ocorrências atribui a criação a Deus (Gn 1.27; 2.3; 5.1,2; SI 148.5; Is 42.5; 45.18) ou chama-o Criador
(Ec 12.1; Is 40.28).
7.
Ver Waltke: "Literary Genre",
3, onde indica que a expressão hebraica "os céus e
a terra" é um exemplo do que os gramáticos chamam hendíadis - o
emprego de duas palavras
independentes ligadas entre si por uma conjunção a fim de expressar uma só
idéia ou conceito (por exemplo: "Envelheci e encaneci", 1 Sm 12.2).
8.
Gn
2.7,8,19; SI 95.5; Is
45.18; Jr 33.2.
9. Mt 19.4;
23.35; Mc 10.6; 13.19; Lc 3.38; 17.26; Jo 8.44; At 14.15; Rm 5.12-19; 8.20,21;
1 Co 11.3,8,9; 15.21,22,45-49; 2 Co 11.3; Ef 3.9; 5.31; Cl 1.16; Hb 4.4;
11.4,7; Tg3.9; 1 Pe 3.10; 2 Pe 3.6; 1 Jo3.12; Ap 22.3.
10.
SI
104.30; 107.9; 145.15,16; 147.9; Mt 5.45; 6.26; 10.29; Jo 5.17.
11.
Gn
1.1; SI 96.5; Is
37.16; 44.24; 45.12; Jr 10.11,12.
12. Millard J. Erickson, Christian
Theology (Grand Rapids: Baker Book
House: 1985), 373.
13.
Gn 1.1; 2.1,4; 2 Rs
19.15; 1 Cr 16.26; SI
8.3; 19.1; 33.6; 96.5; 102.25; 113.6; 136.5,6; Pv
3.19; Is 42.5; 45.12,18; 51.13,16; Jr
10.11; 32.17; At 4.24; Hb
1.10; 2 Pe 3.10 etc.
14. Mt 25.34; Lc 11.50; Jo 17.5,24; Rm 1.20; Ef 1.4; Hb 4.3; 1 Pe 1.20; Ap
13.8; 17.8.
15. Miley se
opõe àqueles
que argumentam que, se Deus é bom e criar é
bom, Ele tinha a obrigação moral de criar. Ver John Miley, Systematic Theology, vol. 1 (Peabody, Mass.: Hendrickson Publishers, 1989), 296, 297; ver
também R. A. Muller, God, Creation, and Providence in the Thought of Jacob
Arminius (Grand Rapids: Baker Book
House, 1991), 230.
16.
Thomas C.
Oden, The Living God (San Francisco: Harper &Row, Publishers, 1987), 198,199, 233. Ver
também
Walter C. Kaiser, Jr., Teologia do
Antigo Testamento, trad. Gordon
Chown (São Paulo,
Edições Vida Nova).
17. Charles Hodge, Systematic Theology, vol. 1 (Nova York: Charles Scribner's Sons, 1887), 568.
18.
Gr. panta, todas as coisas no céu e na terra. Ver pp.
223, 224, 226.
19.
Muller, Arminius, 234, 257, 258; The Writings of James Arminius, trad. J.
Nichols e W. R. Bagnall, vol. 1 (Grand Rapids: Baker Book House,
reimpressão
1977), 70, onde Armínio diz: "A
finalidade da providência" indica, entre outras coisas, "o bem da
totalidade". Ver, também, p. 251
onde a providência é definida como a demonstração por Deus "de uma
solicitude especial por todas as suas criaturas [inteligentes] sem nenhuma
exceção". Ver também vol. 2, 487.
20.
"Bom"
no sentido de apropriado às intenções de Deus. Compare com o uso de
"bom" quando a bola passa pelo aro da cesta ("A jogada foi
boa!").
21. Ver Donald
G. Bloesch, Essenciais of
Evangelical Theology vol. 1 (Nova York: Harper &Row, Publishers, 1979),
38-40.
22.
Ver
também SI 102.25,26; Is 13.10, 13; 34-4; 51.6; Mt 24.35; 2 Co 4.18; Ap 20.11.
Ver
cap. 18, pp. 643-45.
23.
Realmente, "firmamento" traduz a
palavra hebraica raqi'a, que é melhor traduzida por "expansão" e
se refere à atmosfera terrestre onde as nuvens flutuam e as aves voam.
24. W. White, "Astronomy", The
Zondervan Pictorial Encyclopedia of
the Bible, M. Tenney, ed. vol. 1 (Grand
Rapids: Zondervan Publishing Corporation, 1975), 395.
25. H. J. Austel, "shmh"
Vocabulário Teológico.
26.
Por exemplo: Oden argumenta:
"A matéria é criada ex nihilo num
sentido primário, radicalmente dada por Deus, mas que emerge e se desenvolve
através de causas secundárias... Uma vez que algo é criado do nada, outra coisa
poderá, no devido tempo, ser criada a partir das condições que prevalecem e se
desenvolvem" (The Living God, 265).
27.
G. H.
Pember, Earth's Earliest Ages and
Their Connection with Modern Spiritualism and Theosophy (Nova York: Fleming H. Revell Co., 1876), 19-28. Ver também F. J. Dake, God's Plan for Man: The Key to the World's Storehouse of Wisdom (Atlanta: Bible Research Foundation, 1949), 76. Outros versículos que os
adeptos da teoria da lacuna reivindicam como apoio a um período
pré-adâmico
incluem Jó 38; SI 8.3-8; 19.1-6; Pv 8.22-31; Jo 1.3,10; At
17.24-26; Cl 1.15-18; Hb 1.1-12; 11.3; Ap 4.11.
28. Is 14.12-14; Jr 4.23-26; Ez 28.11-17; Lc 10.18; 2 Pe 3.4-8. Pember, Earth's Earliest Ages, 36. Ver
também Dake, God's Plan, 94, 118-24.
29. Arthur C. Custance, Without
Form and Void: A Study of the Meaning
of Genesis 1.2 (Brockville, Ontario: doorway Publications, 1970), 116.
30.
Dake, God's Plan, 124. Na realidade, empregava-se katabolê
no
sentido de semear sementes ou fazer um primeiro pagamento
("entrada"), bem como para "fundação" ou "começo"
- jamais no sentido de derrubar. O uso da palavra, e não sua derivação, é que
determina o seu significado.
31. Pember, Earth's Earliest Ages, 83.
32.
Custance, Without
Form.
33. Ibid., 122, 124- Henry C. Thiessen, Lectures in Systematic Theology (Grand
Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1949), 164.
34. Ibid.
35. Pember, Earth's Earliest Ages, 81. Dake, God's Plan, 134.
36. Ibid.,
118.
37.
C. I.
Scofield, The Scofield Reference
Bible: The Holy Bible (Nova York: Oxford
University Press, 1909), 4, nota 3. Pember, Earth's Earliest Ages, 35.
38.
Waltke,
"Literary Genre", Crux, 3.
39. W. W. Fields, Unformed and Unfilled (Nutley, NJ.: Presbyterian and Reformed Publishing Co., 1976), 70, 71.
40.
A
nossa Bíblia (ARC 1995) sempre traduz male'
como "encher", sem
nenhuma possibilidade de se interpretar por "encher de novo".
41.
Fields, Unformed, 88-97. Versículos citados para pelos adeptos da
teoria da lacuna para sustentar o significado de "tornou-se" têm, na
realidade, outra construção em hebraico e outro contexto. Normalmente, quando a
palavra significa "tornou-se", o hebraico diz "era para"
ou emprega uma forma no imperfeito.
42. A. C.
Custance, "The Flood: Local or Global?", Doorway
Papers No. 41 (Brookville, Ontario: Doorway
Publications, 1989.
43.
J. C.
Dillow, The Waters Above: Earth's
Pre-Flood Vapor Canopy, 2a
ed. (Chicago: Moody Press, 1981), 13.
44. Gn5.3-28; 7.6; 11.10-26; 21.5; 25.26; 47.9; Êx 12.40. Henry M. Morris, The Biblical Basis of Modern
Science (Grand Rapids: Baker Book
House, 1984); J. C. Whitcomb e Henry M. Morris, The Genesis Flood: The Biblical Record and Its Scientific Implications (Philadelphia: Presbyterian and Reformed Publishing Co., 1961), 485.
45. Morris, Biblical Basis, 117.
46. Ibid., 261, 262; Whitcomb, Genesis
Flood, 334. R. V. Gentry, Creation's Tiny Mystery, (Knoxville:
Earth Science Associates, 1986), 164; Morris, Biblical Basis, 477-80; Henry M. Morris e
Gary E. Parker, What Is Creation Science/ (San Diego, Calif.: Creation-Life Publishers, Inc., 1982), 252.
47.
Ibid., 274.
48.
Whitcomb,
Genesis Flood, 116, 117, 265, 291.
49.
A
distribuição fóssil na coluna geológica é explicada por três mecanismos: (1)
zoneamento ecológico pré-dilúvio (elevação do habitat); (2) mobilidade animal;
e (3) distribuição hidrodinâmica
por causa da gravidade específica respectiva de cada organismo. Morris; Biblical
Basis, 361, 362.
50.
Ibid., 123. Whitcomb, Genesis Flood, 455, 456. Adão recebeu a
tarefa de cuidar do jardim (literalmente: "lavrá-lo e guardá-lo"),
que por certo teria incluído a poda da vegetação; mas isto teria resultado na
morte de células somente, e não na morte humana.
51. Essas
pegadas receberam destaque na série de filmes: Origins:
How the World Carne to Be. J. D. Morris, "Identification
of Ichnofossils in the Glen Rose Limestone, Central
Texas", Proceedings of the First International Conference on Creationism (Pittsburgh:
Creation Science Fellowship, 1986), 89, 90.
52.
H. J. Van
Till, D. A. Young e C. Mennings, Science
Held Hostage: What's Wrong with Creation Science and Evolutionism (Downer's Grove, 111.:
InterVarsity Press, 1988), 47,48. Apoiado por T. Norman e B. Setterfield,
"The Atomic Constants, Light, and Time", (Menlo Park, Calif: SRI
International, 1987). Negado por G. E. Aardsma, "Has the Speed of Light
Decayed Recently?" Creation
Research society Quarterly 25 (junho
de 1988),
40, 41.
53. Por exemplo:
para produzir evidências favoráveis à co-exis-tência entre seres humanos e
dinossauros antes do dilúvio (crença obrigatória do criacionismo fiat), Henry
Morris sugere que a palavra hebraica tseph'oni (que
ocorre em Pv. 23.32; Is 11.8; 59.5; Jr 8.17 e que é
chamada tsepha' em Is 14-29) denota
um fóssil vivo, talvez uma serpente voadora (dinossauro?) de algum tipo.
Morris, Biblical Basis, 359, 360. Os
estudiosos do hebraico, por outro lado, consideram tsepha' um termo onomatopéico (a pronúncia da palavra produz
um som
sibilante não muito diferente do de
uma serpente), apropriado para descrever uma serpente, agora identificada como
a víbora do Egeu (Vípera xanthina). William L.
Holladay, A Concise Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament (Grand Rapids:
Wm. B. Eerdmans, 1971), 310.
54. Dan Wonderly, God's Time-records in
Ancient Sediments: Evidence of Long
Time Spans in Earth's History (Flint,
Mich.: Crystal Press, 1977).
55. R. C. Newman e H. J. Eckelmann, Jr., Genesis One and the Origin of
the Earth (Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1977).
56. P. P. T. Pun, Evolution: Nature and
Scripture in Conflict/ (Grand Rapids: Zondervan
Publishing House, 1982), 228, 256-59.
57. Ramm
explica
a sua teoria da criação progressiva:
"Deus, criando diretamente e de modo soberano fora da natureza, leva a
efeito, agora, aquela criação através do Espírito Santo, que está dentro da natureza". Bernard Ramm, The Christian View of Science and Scripture (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1954), 78.
58.
Newman, Genesis One, 85, 86.
59.
Pun, Evolution, 238-39, 247.
60.
Isto
é: uma
centopeia, no período cambriano, era tão centopeia quanto o é agora; um
equinodermo, no período cambriano, era tão equinodermo quanto nos dias de hoje.
61. Van Till, Science Held Hostage, 124.
62. Hugh Ross, The Fingerprint of God. 2a ed. (Orange, Cal.: Promise Publishing Co., 1991), 144,
145.
63. Pun, Evolution, 247, 299. Por exemplo: Ross, Fingerprint,
144-45; Davis Young, Christianity and the Age of
the Earth, 154, 155.
64.
Larkin fez isso ao incorporar
a hipótese
nebular de La Place (1796) na sua
interpretação
da criação. Clarence
Larkin, Dispensational Truth, ed. rev. (Philadelphia: Clarence Larkin: 1918), 20-22.
65. J. P. Moreland, Christianity and the Nature
of Science (Grand Rapids: Baker Book House, 1989), 195-98.
66.
Ramm, The Christian View, 162-168. Ramm
depende demasiadamente de J.
Laurence Kulp.
67. Ver P.
Davis e D. H. Kenyon, Of Pandas
and People: The Central Question of
Biological Origins (Dallas: Haughton Publishing Co., 1989); M. Denton, Evolution:
A Theory in Crisis (London: Burnett Books Limited, 1985); C. Thaxton, W.
L. Bradley e R. L. Olsen, The Mystery of Life's Origin: Reassessing Current Theories (Nova
York: Philosophical Library, 1984).
68.
Emprego com reserva
essa metáfora, dando a entender, neste caso, que os processos verdadeiramente
aleatórios do "acaso" têm sido controlados de tal maneira que os
resultados confirmarão as pressuposições.
69.
E.
Linnemann, Historical Criticism of the Bible: Methodology or Ideology?
Reflection of a Bultmannian Turned
Evangelical, trad. R. Yarbrough (Grand
Rapids: Baker Book House, 1990), 111.
70. Derivado
de 'adamah ("terra",
"solo") e 'edom ("marrom
avermelhado"). Muitos entendem com isso que Adão, ao ser criado, possuía
um conjunto completo de fatores de hereditariedade
(genes) que podiam separar-se nos várias cores
de pele que hoje conhecemos. Ver Walter
Lang, Five Minutes with the Bible and Science, (Grand Rapids: Baker Book House, 1972), 44.
71.
O feminino 'ishsha significa
"mulher" ou "esposa".
72.
Anêr é o termo
empregado para um homem individual ou marido; gunê significa
"mulher" ou "esposa".
73. Gordon D. Fee, The First Epistle to the
Corinthians (Grand Rapids: Wm. B.
Eerdmans, 1987), 52, n. 22.
74.
H. Vorlander, "anthrõpos",
Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, Colin
Brown, ed.;
trad. Gordon Chown, vol. 2 (São
Paulo: Edições Vida Nova, 1982), 375.
75. 1 Tm
2.3-6; 4.10; Tt 2.11; Hb 2.9; 2 Pe 3.9; 1 Jo 2.2; Ap 22.17. H. Wayne House,
"Creation and Redemption: A Study of Kingdom Interplay", Journal of the Evangelical Theological Society 35 (março
de 1992), 7.
76. Gn 1.26,27; 2.7; 3.19; 5.1; 6.7; Dt 4.32; SI 90.3; 103.14; 104.30; Ec
3.20; 12.7; Is 45.12; 1 Co 11.9; 15.47. Ver Rankin: "The Corporeal Reality
of Nephesh and the Status of the
Unborn", Journal of the Evangelical Theological Society 31 (junho de 1988), 154, 155.
77. D. Müller, "Vontade, Propósito", Dicionário Internacional de
Teologia do Novo Testamento, vol. 4, 781.
78.
Rankin,
"Corporeal Reality", 156.
79. Para uma análise completa de nephesh, ver R. L. Harris, Man - God's Eternal Creation:
Old Testament Teaching on Man and His Culture (Chicago: Moody Press, 1971), 9-12; E. Brotzman, "Man and the Meaning
of Nephesh", Bibliotheca Sacra 145 (outubro-dezembro de 1988) 400-09.
80. Colin Brown,
"Alma", Dicionário Internacional de
Teologia do Novo Testamento, vol. 1., 149-159.
81.
O Aramaico diz, literalmente:
"Quanto a mim, Daniel, meu espírito ficou aflito no seu invólucro". A
Septuaginta, no entanto, divide as palavras de modo diferente: "por causa
disso", ao invés de "no seu invólucro".
82. J. B. Payne, "ruach",
Dicionário Teológico do Antigo Testa-mento.
83.
Colin Brown,
"Espírito", Dicionário Internacional de Teologia
do Novo Testamento, Vol. 2, 122. Rm 8.16; Gl 6.18; Fp 4.23; 2 Tm 4.22; Fm 25; Hb 4.12; Tg 4.5. Brown,
"Espírito", vol. 2, 123.
84.
Erickson, Christian Theology, 520; Myer Pearlman, Conhecendo
as Doutrinas da Bíblia, trad. N. Lawrence
Olson (São Paulo: Vida).
85.
Wiley, Christian Theology, vol. 2, 18. Wiley cita
outros exemplos de erros históricos devidos à falta de equilíbrio ao lidar com
os elementos dentro do tricotomismo.
86. Erickson,
Christian Theology, 521.
87. Pearlman,
Conhecendo as Doutrinas da Bíblia, 101.
88. Erickson,
Christian Theology, 523, 524.
89.
D. B. Fletcher,
"Monismo", Enciclopédia Histórico-Teológi-ca
da Igreja Cristã, Waler Elwell, ed.; trad. Gordon
Chown (São Paulo: Edições Vida Nova, 1990), vol. 2, 548.
90.
Erickson, Christian Theology, 526.
91.
Lc 22.43; 2 Co 5.6,8; Fp 1.21-24. Ver
também
cap. 18, pp. 617-22.
92.
Ver cap. 8, pp. 286, 287.
93.
J. S. Wright, "Homem", Dicionário Internacional
de Teologia do Novo Testamento, 378-80.
94. Ver Dr.
Liley, em J. C. Willke, Abortion:
Questions and Answers, ed. revisada (Cincinnati: Hayes Publishing Co., Inc.,
1990), 51, 52.
95.
Não resumiremos teorias pagãs,
tais como a reencarnação, que contraria o conceito linear da história mantido
pela Bíblia.
96. Charles Hodge, Systematic Theology, vol. 2 (Nova York: Scribner, Armstrong, and Co., 1877), 66.
97. Louis Berkhof, Systematic Theology, 4a ed. (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1941), 199.
98. Strong, Systematic, 491, 492.
99. Ibid.,
493, 494.
100. Thiessen, Lectures, 165.
101.
Lc 1.35;
Jo 14.30; Rm 8.3; 2 Co 5.21; Hb 4.15; 7.26; 1 Pe 1.19; 2.22.
102. Para a interação com Aquino e
outros que diziam que o homem e a mulher levavam igualmente a imagem no sentido
primário mas que eram desiguais num sentido secundário, ver H. Lazenby,
"The Image of God: Masculine, Feminine, or Neuter?", Journal of the Evangelical Theological Society 30 (março de 1987), 63, 64.
103.
O
grego especifica que as esposas estão submissas aos seus "próprios" (idiois) maridos.
104. Note que os cidadão estão submissos aos governantes
(Rm 13.1); a igreja, ao seu líder (1 Co 16.16); e o jovem, ao velho (lPe5.5).
105. M. K.
Mayers, "Race", The Zondervan Pictorial Encyclopedia
of the Bible, Merrill C.
Tenney, ed. vol. 5 (Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1975), 22. Note que todos os descendentes de Caim morreram no dilúvio. E, também, que a maldição de Noé repousava somente sobre Canaã, ancestral dos cananeus, e não sobre os descendentes
africanos de Cão. Sem dúvida, a família de Noé possuía fatores hereditários que acabariam
produzindo as raças de pessoas que temos hoje.
106. Erickson, Christian Theology, 541.
107. Ver W.
Kaiser, Hare? Sayings of
the Old Testament (Downer's Grove, 111.:
InterVarsity Press, 1988), 78-84.
108.
Essa
doutrina errônea tem achado apoio entre os preletores da chamada Palavra da Fé.
109. Gordon Anderson, "Kingdom Now Theology: A Look at Its Roots and
Branches", Paraclete 24 (verão de 1990), 8-11.
110.
Wiley, Christian Theology, vol. 2, 32-39.
111.
Ver M. Cosgrove, The
Amazing Body Human: God's Design for Personhood (Grand Rapids:
Baker Book House, 1987), 163, 164.
112.
Writings of James Arminius, vol.
1, 526; ver também vol. 2, 472, 473.
113. 1 Rs 8.47;
2 Cr 20.20; Pv 1.23; Is 31.6; 43.10; Ez 14.6; 18.32; Jl 2.13,14; Mt 3.2; 18.3;
Mc 1.15; Lc 13.3,5; Jo 6.29; 14.1; At 2.38; 3.19; 16.31; 17.30; Fp 1.29; 1 Jo
3.23.
Autor: Timothy Munyon
AVALIAÇÃO
1. O que significa a frase "criação ex
nihilo", e que evidências bíblicas
existem em favor dessa doutrina?
2.
Por
que os cristãos devem envolver-se na tentativa de harmonizar os dados bíblicos
com os dados científicos?
3.
Que
bom resultado tem havido no debate atual entre os proponentes dos vários
modelos criacionistas?
4.
Quais
as vantagens da teoria da unidade condicional da constituição dos seres
humanos, em contraste ao tricotomismo e o dicotomismo?
5.
De
que se constitui a imagem de Deus nos seres humanos?